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Abadia de Moissac – Pedras que Falam

A Abadia de Saint-Pierre de Moissac é um complexo arquitetônico religioso que se destaca por suas extraordinárias esculturas românicas, localizado na cidade francesa de Moissac, no Caminho de Santiago de Compostela. O prédio impressiona, também, por sua paz e enorme espiritualidade.

Fundado no século VII, foi saqueado pelos muçulmanos depois de serem derrotados na batalha de Poitiers, incendiando-o no ano de 1042. Mas o mosteiro será ligado à poderosa ordem da Abadia de Cluny no ano de 1047. Com o abade Durand, monge formado em Cluny, deu-se a reforma espiritual e material do prédio semidestruído. Mais tarde, um dos seus sucessores, o abade Ansquitil, monge de extrema sensibilidade artística (1085-1115), encarregou-se da edificação do claustro que sofreu uma enorme modificação estrutural.

Com o apoio significativo de Cluny o mosteiro tem prosperidade e tranquilidade permanecendo sem sobressaltos até o século XV.  As pedras são assíduas dialogantes dos monges. Durante a Revolução Francesa, ele sofreu inúmeras dificuldades, mas com apoio de muitos principalmente dos peregrinos que iam para Santiago de Compostela o claustro e a frente ocidental se mantiveram intactas. Os maravilhosos vestígios da arte românica da Abadia de Moissac foram preservados.

A história mudou o tamanho do grande mosteiro que faz parte da abadia. A lenda atribui sua fundação à Clovis I (481-511), cuja conversão significava o triunfo do catolicismo na Gália. Depois de derrotar os visigodos arianos, uma visão milagrosa inspirou-o para criar na confluência do rio Tarn Garonne, um grande mosteiro destinado a mil monges.

Sem documentação para provar, usando manuscritos do monge e santo St. Didier, bispo de Cahors, como a fonte mais aceita pelos historiadores é creditado para o rei Clovis II (635-657), que entre 630 e 655 cuidou de sua fundação, pois a Abadia desde o início da sua construção gozava de favores reais.

O magnífico claustro de Saint-Pierre de Moissac é emblemático. Assustadoramente belo. O claustro, que é acessado a partir da Plaza de Durand de Brendons foi concluído em 1100, quando Ansquitil era o abade, ele mantém seus 76 capitais excepcionais.

A mistura de capitéis decorados com magníficas plantas decorativas é um exagero de beleza arquitetônica. As flores de canto são de uma perfeição estrutural de extremo bom gosto. Os detalhes impressionam. Nos ábacos, animais reais e fantásticos, incluindo figuras humanas aparecem às vezes, e têm se mantido intactas apesar dos anos. Na banda superior da dos bordados são vistas conchas com formas geométricas, com inscrições que se relacionam com a iconografia do capitel em que as mesmas aparecem, perfeito. Em outros capitéis, de uma beleza estonteante, cinzéis escrevem as cenas do Antigo Testamento a partir da Paixão de Cristo, e da Redenção, e distribuído entre eles pode se ler outros itens como: milagres ou martírios de santos e algumas páginas do Apocalipse.

A porta ocidental e o tímpano da Igreja de Moissac impressiona pela riqueza nos detalhes das pregas e drapeados das roupas, inseridas nas estruturas arquitetônicas românicas, espantam pela perfeição. Mas acima de tudo, faz nos admirar, a capacidade de transmitir atitudes dos personagens dentro e fora do tímpano que parece receber seus visitantes sussurrando canções espirituais e de paz.

Entre 1115 e 1130 esta cobertura magnífica foi concluída. O tímpano de cerca de seis metros de diâmetro, repousa sobre um lintel* formado com três blocos de mármore bordados com um grande número de rosetas. O lintel busca seu apoio no batente central e dois batentes suplementares de sustentação para as suas imagens: à esquerda, São Pedro, padroeiro da abadia, e à direita do profeta Isaías são referências para o Novo e o Velho Testamento. Duas pilastras com decoração maravilhosa e meticulosa, na parte superior do portal, dão ao pórtico uma beleza ainda maior.

Os fiéis que lá adentram, principalmente àqueles que se dirigem Á Santiago de Compostela relatam que as vozes das pedras sussurram em seus ouvidos animando-os diante da árdua caminhada que ainda lhes resta. O complexo é uma enorme pedra bíblica dirigida a um povo iletrado sedento de fé. Um magnífico trabalho do medievo uma obra-prima da escultura românica.

Há muito mais nestas paredes do claustro, da igreja que apenas com calma, serenidade e sensibilidade que um dia talvez eu perceba com o meu coração e lentamente comece a ouvir as pedras contarem a história deste maravilhoso lugar.

*Em arquitetura, um lintel é uma peça dura de materiais diversos (madeira, ferro, pedra, concreto, etc.) que assenta nas ombreiras, ou jambas e constitui o acabamento da parte superior de portas e janelas; sendo também chamado de dintel, padieira ou verga.

Paulo Edmundo Vieira Marques, professor, historiador e escritor medievalista

 

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Bruniquel – A Joia Medieval do Midi-Pirinéus

Bruniquel é uma pedra preciosa. Comuna francesa no departamento de Tarn-et-Garonne na região da Ocitânia. Bruniquel faz parte da lista das mais belas aldeias da França. Seus habitantes são de uma hospitalidade ímpar conforme relatos de amigos que lá visitaram os seus maravilhosos monumentos.

Bruniquel está localizada em uma colina íngreme com vista para a confluência do rio Vere, que vem de Albi, e do rio Aveyron que corre pelo desfiladeiro de mesmo nome, esculpido no planalto de calcário de Limogne. Pequena vila medieval de Quercy com mais ou menos 900 habitantes fixos, a maravilha do medievo do Tarn, desponta por suas casas e fortificações medievais. Está localizada 28 km a leste de Montauban.

O castelo da rainha Brunhild domina o lado do penhasco de Aveyron. O lugar foi atribuído à rainha em 587 até sua execução, em 613, triste morte, com o cabelo da soberana amarrado à cauda de um cavalo. O castelo também foi utilizado nas filmagens de Jeanne D’Arc, de Luc Besson.

A pequenina cidadela foi conquistada em 1176 pelos condes de Toulouse, Casa Trencavel. Em 1211 o trovador Guilhem de Tudèia, co-autor da “Canção da Cruzada”, se refugiou com Baundoin de Toulouse (meio-irmão do Conde Raymond VI) que ofereceu Bruniquel aos cruzados dissidentes e favoráveis a um movimento contrário a religião católica. Descoberto foi julgado como traidor sendo enforcado 1214, em Montauban.

 Após a cruzada, a vila experimentou um grande incremento comercial uma vez que estava no caminho de peregrinos de Saint Jacques de Compostela. A sua igreja, de uma estrutura simples mas com recantos para o descanso e reza dos peregrinos ganhou fama.  A maioria das casas foi construída entre o séculos XIV e XVI, principalmente em pedra, mas também em enxaimel. A maioria manteve suas ruas sinuosas e pavimentadas com pedras rústicas. No topo da colina se localiza castelos de excelente preservação datados do século XIII e XIV. Parcialmente destruídos após a paz de Montpellier em 1622 entre Louis XIII e protestantes, eles foram restaurados de forma considerável.

Bruniquel, em seguida, fica adormecida. No século XIX desperta para desenvolver atrações turísticas e paisagens que levam inúmeros artistas e pintores lá residirem.

De 1915 a 1921, Marcel Lenoir, pintor da escola Montparnasse, admirada por Picasso, vive nas proximidades e parte de sua obra é exposta no Museu Castelo de Montricoux. Castelos de Bruniquel ficam imortalizados no cinema no filme de Robert Enrico Le Vieux Fusil em 1975.

A história também observa que, nos primeiros dias da Segunda Guerra Mundial, como parte dos planos de evacuação para as pessoas que vivem perto das fronteiras do Oriente e as áreas prováveis ​​de luta, residentes Salonnes em Moselle (Lorraine) foram transportados para Bruniquel. Após o armistício, em junho de 1940 e significando o fim dos combates, alguns dos refugiados foram autorizados a voltar para casa em Lorraine, alguns optaram por ficar em Quercy.

Bruniquel é uma meta que ainda vou perseguir para conhecer os seus segredos e belezas. Estava no meu roteiro de 2015, mas em virtude de fortes chuvas à época não pude subir as colinas da maravilhosa joia do Midi-Pirinéus. Mas não te esqueci doce cidadezinha. Aguarda-me.

Paulo Edmundo Vieira Marques

Professor, Historiador e Escritor Medievalista

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Catedral de Lincoln – Fé nas Alturas

Considerada a segunda maior igreja da Inglaterra, no estilo gótico, a Catedral de Lincoln é realmente imponente por sua grandiosidade e beleza. Sua majestosa e deslumbrante construção realmente nos impressiona. Também chamada de Catedral de Santa Maria, possui enormes vitrais, esculturas, 20 grandes sinos. Existem treze sinos na torre sudoeste, dois na torre noroeste e cinco na torre central e, atualmente, é a sede da igreja anglicana.  Em extensão, é a terceira maior abadia da Inglaterra, possuindo 148×83 metros. É considerada uma das igrejas mais altas do planeta, com 160 metros de altura. Entretanto, a altura exata tem sido tema de debates.

Por quase 300 anos, a Catedral de Lincoln foi o monumento mais alto do mundo, e suas incríveis dimensões ainda dominam a histórica cidade. É amplamente considerada uma das mais belas construções góticas do mundo e está repleta de esculturas surpreendentes.

Remigius de Fècamp, primeiro bispo de Lincoln, ordenou a construção da catedral em 1072. Antes disso, a Igreja de Santa Maria em Lincoln era uma igreja-mãe, mas não uma catedral, e a sede da diocese era a Abadia de Dorchester em Dorchester-on-Thames, Oxfordshire. A primeira Catedral de Lincoln, construída no lugar onde se encontra atualmente, foi finalizada em 1092. Em 1141, a cobertura de madeira foi destruída em um incêndio. O bispo Alexandre reconstruiu e expandiu a catedral, mas ela foi novamente destruída por um terremoto cerca de quarenta anos mais tarde, em 1185.

Após o terremoto, um novo bispo foi nomeado. O bispo era Hugo de Avalon (assim chamado por ter nascido em Avalon, na França); ele iniciou um programa de reconstrução e expansão maciça.

A catedral é a terceira mais extensa da Grã-Bretanha (compreendendo a planta baixa), depois da Catedral de São Paulo e da Catedral de York, com medidas surpreendentes acima descritas. O seu interior é de um esmero encantador e de uma preservação maravilhosa. Ela é o maior edifício de Lincolnshire e até 1549 sua torre era considerada a mais alta torre medieval da Europa.

Dentro de suas curiosidades destaca-se; a Catedral de Lincoln foi usada como locação para as filmagens do filme: o Código da Vinci, estrelado por Tom Hanks e também para do longa-metragem: A Jovem Rainha Vitória.

Espero, se Deus quiser, poder visitar esta maravilha do gótico. Sem dúvida uma dádiva do medievo. Esplêndido e encantador trabalho.

Paulo Edmundo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista

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Saint-Côme-d’Olt – Cativante Medievo

Saint-Côme-d’Olt foi uma grata surpresa para os participantes da nossa maravilhosa viagem. Todo o seu perímetro urbano é cercado por muralhas medievais que permitem adentrar na cidade através de suas três portas fortificadas. Qualquer que seja a sua opção, a entrada que você escolher, lhe proporcionará uma cativante volta ao passado, ao intrigante mundo medieval. Um museu a céu aberto, um momento de refletir e analisar esse belo patrimônio cultural.

Sublime medievo. Vilarejo cativante que fez a todos maravilhar-nos com a sua conservação datados em sua maioria dos séculos XV e XVI. Pude sentir o medievo pulsar em minhas veias. As ruas nos convidavam para um passeio medieval. Incrivelmente nos arrastavam para uma caminhada que jamais deixaríamos de nos lembrar. Momentos inesquecíveis. 23.04.2015, o medievo é hoje.

O ônibus estacionou em frente a Place de la Porte Théron e andamos felizes e maravilhados com a cidade velha. Do outro lado da área fortificada descobrimos o elemento primordial da exuberante vila medieval; a sua bela igreja, símbolo da comunidade de Saint-Côme-d’Olt, (basicamente por causa de seu sino trançado, torneado). Fui o primeiro a chegar em suas escadarias e lá encontrei um típico agricultor francês que lá tinha ido fazer as suas preces. Em espanhol falamos e ele me deu as primeiras considerações e dados históricos do lindo prédio. Igreja Gótica Flamboyant, foi construída entre 1522 e 1532 pelo arquiteto Jean Salvanh. A torre sineira é certamente uma raridade em França, mas se também destaca o portão de entrada, (porta principal da igreja) uma vez que é adornada por 365 medalhões cravados com pregos de ferro forjado, datada de 1522. Uma preciosidade artesanal de uma beleza estonteante.

Seu interior é gótico e tem mobiliário dignos de interesse, como um Cristo feito em madeira nogueira do século XV, um retábulo barroco todo entalhado com uma Pietá em madeira dourada do século XVIII. Preciosidades dignas de registro pela qualidade dos trabalhos.

Seguimos entusiasmados pelas ruas medievais da pequena cidadezinha e a cada passo nos deparávamos com ruelas notadamente preservadas. A comunidade se empenha ao máximo para manter as características do povoado da melhor maneira possível.

Em frente à igreja se encontra “Le Manoir des Sires de Calmont, atual prefeitura da cidade. O edifício foi construído no século XII pelo Conde de Calmont e apesar de ter sido restaurado várias vezes, o tempo o castigou. No entanto preserva duas torres do século XIV que chamou muita a minha atenção pelos dados arquiteturais medievais que contém. Embora fosse um internato religioso escolar até 1891, depois passou para as mãos da família Castelnau Curières que vendeu para o município em 1970 onde foi instalada a Câmara Municipal.

Caminhamos pelas suas ruas ainda por um bom tempo e regressamos à cidade velha até chegar à “La Maison des Consuls Rodelle”, localizada em uma das ruas mais antigas da vila (Rue du Four) mais uma vez observamos várias casas do século XIV, XV e XVI. Destaca-se as suas janelas de formas curiosas e bem cuidadas.

Retornando ao ônibus percebi que sentiria uma enorme saudade desta pequenina, mas bela cidadezinha francesa. Acolhedora nos proporcionou retornarmos ao sublime medievo. Simples e espontâneo. Até a volta.

Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista.

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Notre Dame de Grasse – Sublime Paz

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No meu segundo dia em Toulouse, França, tive o privilégio de visitar o Museé des Augustins. Depois de tantos anos estudando a Idade Média me deparei com uma obra divina. No primeiro momento que olhei para a estátua de Notre Dame de Grasse, senti a mão da mãe de Jesus me acariciar. A sensação foi de uma enorme paz. Senti, perfeitamente sussurros em meu ouvido dizendo, “vá em paz e mostre-lhes o caminho do bem”.

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Sem dúvida, para mim, a representação da Virgem e o Menino mais impressionante da Baixa Idade Média. Ela contém, um nome, de uma inscrição com caracteres góticos que se encontra na sua base, em ambos os lados em um escudo infelizmente inelegível. Se a sua proveniência local, parece assegurada, o seu autor é de difícil analise e decifração. Somente o estudo estilístico ajuda a colocá-la nos anos 1460-1480. Seu rostinho com um olhar pensativo e melancólico é encontrada particularmente em grande parte na escultura local, do Tarn e Aveyron; os seus vestidos longos, caindo aos pés da Virgem, é uma característica das obras sacras femininas da região. Um trabalho exemplar de restauração foi feito para restabelecer esta magnífica obra e a sua delicada policromia de origem.

O estudo de sua restauração também forneceu uma oportunidade única para melhorar o conhecimento da obra e sua história. Uma comissão foi convocada, composta por historiadores, acadêmicos, curadores e restauradores, para ajudar o museu nas melhores escolhas para a sua restauração mais aproximada da obra original.

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Escultura icônica do Museu Augustins e da cidade de Toulouse, Notre Dame de Grasse tem sido objeto de uma atenção muito especial dos visitantes do museu.

Hoje a restauração está concluída e a sua beleza encanta, cativa nos hipnotiza de uma maneira prazerosa e respeitosa. Apesar de não sabermos o autor da obra, fica-nos a impressão que nos foi agraciada pelo Espírito Santo tamanha singeleza e perfeição.

De acordo totalmente com o grande historiador francês Phillippe Ariès minhas considerações a respeito da Virgem é coincidente em seus extremos elogios; cita o grande observador da História;

“Si, dans une fuite de fin du monde, il me fallait n’emporter qu’une seule œuvre d’art, peinture ou sculpture, je ne me laisserais pas tenter par les plus célèbres, vues et revues cent fois avec la même délectation, une prédelle du Sassetta, un Vermeer, un Manet, non, sans hésiter, je choisirais : Notre-Dame de Grâce. Ravissante, elle ne manque pas de rivale dans le charmant art marial du XIVe au XVIe siècle. Mais aucune n’est aussi proche de mon cœur, aussi liée à ma vie”.

Phillippe Ariès, “Notre Dame de Toutes les Grâces”, Le Nouvel Observayeur, 23-29 décembre 1983, p. 40.

Sublime Virgem, Paz que emana, agradeço a oportunidade de tê-la conhecido, tocá-la. Notre Dame de Grasse não se preocupe seus pedidos em seus sussurros eu estou repassando-os da melhor maneira possível para os homens de boa vontade.

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Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador, Escritor Medievalista.

Este artigo é uma homenagem para a minha querida amiga Patricia Jane Dugan.

 

 

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Notre Dame de Paris – A Essência da Arte

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Nossa Senhora, Paris aos seus pés. Abe Deo Vincit Notre Dame

Uma emoção avassaladora tomou conta do meu peito quando vi a  Catedral de Nossa Senhora de Paris pela primeira vez. Meus pés pareciam flutuar, minha mente demorou alguns segundos para se recompor. Lá estive por três vezes, mas a última, quando consegui  a oportunidade de trilhar as maravilhas da Sagrada Senhora sozinho foi inesquecível. A partir dali a minha vida não foi a mesma pois levei em minha mente mais 800 anos de História, foi perfeito. A Catedral, conhecida como Notre Dame de Paris (Nossa Senhora de Paris) é um ponto de referência histórico, um pilar de Arte, a fundação da espiritualidade, e claro, um local imperdível em Paris!

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A Catedral de Notre Dame de Paris, foi considerada por Victor Hugo como o paradigma das catedrais francesas, estabeleceu o modelo ideal do templo gótico, constituindo um dos exemplos mais equilibrados e coerentes deste período.

Relatando a minha experiência digo-lhes que assim que você chegar à grande praça em frente à catedral em Ile de la Cite, um certo silêncio toma conta de você; do tipo que preside à abertura de um livro. Um espírito de competição tomou conta do século XII no que se referia à construção de catedrais. O desconhecido mestre (idealizador e construtor) dos trabalhos de Notre Dame em Paris, logo no início do trabalho em 1150, decidiu que esta catedral seria a mais alta igreja existente na época. Assim os trabalhos começaram e, quando o coro estava praticamente terminado, foi tomada mais uma corajosa decisão, aumentar ainda mais a altura da catedral, agora a uma altura um terço mais alta do que qualquer outra catedral existente.

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Notre Dame tornou-se assim um lugar de grandes discussões pois, além da beleza criada pela grande altura, muitos problemas, nunca antes enfrentados, começaram a surgir. Sua altura se tornou tão grande que a luz que entrava pelas janelas situadas na parte superior das paredes da catedral não atingia o chão. Quanto mais alta ficava sua estrutura, mais problemas eram encontrados, dentre eles a grande velocidade e, principalmente, a grande pressão dos ventos.

A perfeição e habilidade do trabalho de Jean de Chelles, desenvolvendo a geometria e supervisionando o corte das pedras, foi tanta que essa moldura de pedra vem suportando 117 metros quadrados de vidros há mais de 700 anos e, nos 100 anos seguintes, pouco menos de 20 janelas tentaram superá-la em tamanho, porém nenhuma realmente conseguiu.

z906Nossa Senhora de Paris tem contado uma história desde que ela foi consagrada em 1163. Ela é ao mesmo tempo uma bíblia e uma lição sobre a moralidade. Apenas, doutrinas e símbolos do Livro foram substituídas por expressões em pedra e vitrais. A Torre, na fachada ocidental, são três portas maravilhosas com entalhes perfeitos, arte pura, com ricos significados simbólicos, convidando-o a entrar em uma das mais belas igrejas góticas do mundo.

z907Esculturas elaboradas de pedras decoram as três entradas que são de tamanhos diferentes: a central, conhecida como Juízo Final, a do Sul ou a porta de Saint Anne, e a porta da Virgem ao Norte. As torres são de uma beleza indescritível, olhando para cima vê-se duas incríveis torres do século XIII que abraçam o céu parisiense. Conforme você sobe os 387 degraus, dê uma olhada mais de perto na galeria das quimeras. Representações, como Stryge, a gárgula no relógio no topo de Paris, vão deixar você sorrindo, chocado, e em perplexidade. Quando você retomar o fôlego, fique cara a cara com Emmanuel, o grande burdon e maior sino da catedral. Três janelas de rosas dentro do edifício, lhe farão incrédulos, uma lição sobre a perspectiva e efeitos de iluminação o aguardam.  Fiquei paralisado quando fitei os deslumbrantes 12,9 metros de largura do grande vitral, filtrando a luz para revelar a majestade da arquitetura medieval. Os pilares assustadores que parecem desafiar gravidade suportando a 33 metros de altura o teto abobadado. Outros tesouros históricos podem ser vistos como: Relíquias da Paixão, as joias da Notre-Dame de Paris que se encontra na abertura da sacristia no lado sul do coro. Cerca de 13 milhões de visitantes anuais migram para ver o relicário mais precioso e objeto mais reverenciado: a coroa de espinhos. Outras relíquias exclusivas incluem um fragmento da Vera Cruz, enfim Notre Dame é um épico da História universal, A “The Best” das catedrais medievais. z908

A Joana d’Arc de Notre Dame seguidamente me vem em meus sonhos. Tenho certeza absoluta que a santa guerreira olha por mim e aos meus todos os dias. Benditas preces. Minhas lembranças da grandiosidade do prédio não me saem da cabeça. 

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Saudades, saudades, muitas. Decididamente e comprovadamente o “Medievo Bonito” demonstra a sua magnitude e o legado universal da Catedral de Notre Dame continua a viver.

a900Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador, Escritor Medievalista.

Esse texto eu dedico para a minha família, Razão do meu seu ser e das minhas atitudes.

Gladius Auxilius Nobis

 

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Cavalaria do Medievo Miles Seculi – Natureza e Sentido

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A forma exterior da Cavalaria, foi sem dúvida, cristã. Elaborada pela igreja, foi o resultado de um longo e exaustivo esforço desta para enquadrar e canalizar o ardor de gerações de guerreiros, afim de lhes dar acesso à graça, portanto ao Reino de Deus. Ao guerreiro bravo, forte, a igreja repassa a ideologia do guerreiro benfeitor, exemplo edificante dos santos militares, o soldado que coloca a sua espada ao serviço de Deus e da Igreja, dando-lhe, através disso, uma mística própria. Propõe ao cavaleiro, integrado na vida secular, o miles seculi, uma vida particular que lhe permite, pelo ofício das armas e segundo a sua própria natureza, agir em função de um estado de espírito e de escolhas pessoais, no sentido de realizar harmoniosamente a sua vocação espiritual e temporal.

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A Cavalaria é constituída sob a forma de “corpo” e definida pelos textos e manuscritos medievais como uma “confraria de guerreiros íntegros” possuindo o seu código de conduta, os seus santos protetores, os seus mitos fundadores, os seus ritos (velada de armas, palmadas, etc.), o seu simbolismo (espadas, esporas, estandartes, etc.), os seus mestres (senhores) os seus companheiros (os Cavaleiros investidos), os seus aprendizes (os escudeiros).

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De acordo com os meus estudos e com a minha sensibilidade que não me abstenho de maneira alguma, a Cavalaria medieval, em sua essência provém de um ethos não cristão, o qual em muitos pontos, é incompatível com os Evangelhos, e não me parece seguir rigorosamente os ensinos e regulamentos da igreja. Se é verdade que a totalidade dos Cavaleiros é cristã, frequentemente de forma não ortodoxa, não hesitando em dar a vida pela sua fé, também não restam dúvidas de que ideais básicos da sua ética provêm de valores pagãos.
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Deste modo, dando prioridade às noções de fidelidade, de honra, de sacrifício, de respeito pela palavra dada, as noções de covardia e de vergonha (mais do que pecado) que mancham a honra do homem e da sua linhagem, de lavar uma injustiça pelo sangue (mais do que o perdão cristão), de querer a paz pela vitória das armas (noção romana), etc., o Cavaleiro afirma claramente uma ética heroico-pagã, no seio de um universo superficialmente cristão. Podemos estender tais constatações à prática do “julgamento de Deus” à “prova pelas armas”, reconhecida como válida pelo direito feudal e pelo direito canônico, para provar a excelência do seu direito, reparar a honra injuriada ou ainda humilhar um perjuro ou um herético. Esta prática esteve ligada à teoria mística da vitória unida ao espírito, que proporcionava ao vencedor, para além da glória, o fogo divino próprio da natureza solar, uma espécie de acesso a transcendência e de reconhecimento divino, com Deus favorecendo o “justo”, tornando um “ser” tão próximo dos “céus” como o poderia ser um santo, e punindo o vencido como culpado ou pecador pela sua falta. Todos estes usos, estranhos às religiões dualistas semitas, forma encontrados, pela Igreja triunfante, vencedora, tão bem implantados no seio das populações recentemente cristianizadas, que não pôde senão integrá-los no seu “corpo” doutrinal, dando-lhes uma coloração cristã através de um revestimento teísta e moralizador. É assim possível falar, não de uma cristianização destas práticas, mas da manutenção da antiga virilidade espiritual sob uma forma cristã, “onde a via do guerreiro sacral se substitui à do santo ou do devoto”. A mais bela ilustração disto foi a ideia nórdico-romana, de que a prova das cruzadas constitui uma espécie de Athanor*, vivido pelo Cavaleiro como uma possibilidade de transcender a sua natureza humana; e o seu corolário, a morte física, a fim de aceder à imortalidade da alma, seguindo nisto a recomendação de São Bernardo de Claraval*, de “conquistar o Paraíso pela espada”

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São Bernardo de Claraval

 

*O athanor também chamado forno cósmico, é um forno utilizado na alquimia para fornecer calor para a digestão alquímica. Era considerado o forno filosófico, o qual deveria permitir a obtenção da pedra filosofal (lapis philosophorum)
*Bernardo de Claraval foi um influente abade da Igreja Católica na Idade Média. Nascido em 1090 em Borgonha, Bernardo era proveniente de uma família nobre e era um dos sete filhos de Tescelin Sorrel com Aleth de Montbard. Iniciou muito cedo sua vida religiosa. Aos nove anos de idade começou seus estudos na Escola Canônica de Châtillon-sur-Seine. Pouco tempo depois, optou por ingressar na Abadia de Cister. Entusiasta da vida religiosa, Bernardo convenceu vários amigos e parentes a ingressarem também na vida monástica, levando consigo mais 30 candidatos para a Abadia. Em função da dedicação religiosa de Bernardo, foi designado para um projeto que seria de grande apreço para o resto de sua vida, a fundação de uma casa cisterciense em Ville-sur-la-Ferté. A fundação foi chamada de Claraval e Bernardo foi nomeado como abade. Isso tornou Bernardo conhecido como Bernardo de Claraval. Bernardo de Claraval teve anos iniciais difíceis com regras religiosas severas. Porém era um religioso dedicado e interessado. Sua abadia cresceu satisfatoriamente, a ponte de, em 1118, outras serem fundadas para não superlotar Claraval. No ano seguinte, Bernardo de Claraval escreveu suas primeiras obras que aumentariam sua popularidade. Destacou-se também como defensor do reformismo do clero. No final da década de 1110, foi fundada no Oriente a Ordem dos Cavaleiros do Templo de Salomão, ou simplesmente Templários. Alguns anos depois, Bernardo de Claraval tomou conhecimento do objetivo dos monges guerreiros e tornou-se um defensor do ideal. Bernardo de Claraval foi responsável por fazer chegar ao papa Honório II a informação sobre o objetivo dos Templários e, com isso, buscar o reconhecimento e o apoio da Igreja Católica. O encontro com o papa ocorreu no Concílio de Troyes, em 1128, o qual foi muito influenciado por Bernardo. Este conseguiu o reconhecimento da Igreja Católica sobre os Templários e ainda ficou encarregado de escrever o estatuto da Ordem. Bernardo de Claraval, após o Concílio de Troyes, tornou-se uma personalidade muito respeitada no mundo católico, com liberdade para intervir em assuntos políticos e com voz de destaque na defesa dos direitos da Igreja. Com o falecimento do papa Honório II, criou-se um cisma, mas foi Bernardo que influenciou pela escolha de Inocêncio II como papa. Mais tarde, em 1145, Bernardo seria responsável diretamente por outro papa, Eugênio III. Após longos e influentes anos de vida religiosa, Bernardo de Claraval foi responsável por fundar 72 mosteiros, havia mais de 500 abadias cistercienses e mais de 700 monges ligados a Bernardo de Claraval. Bernardo de Claraval faleceu em 1153. Muitos milagres foram atribuídos a ele e o papa Alexandre III o canonizou em 1174 e, muitos séculos mais tarde, foi declarado Doutor da Igreja pelo papa Pio VIII.
Imagens pesquisadas junto à British Library, Londres, Inglaterra.

 

Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista

 

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Catedral de Notre Dame de Rodez – A Rosa Imponente

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Rodez é uma cidade da região (ou departamento) de Aveyron, no sul de França, com cerca de 25 mil habitantes. Ao longe, da estrada já se avista a gigante rosa resplandecendo ao fundo. Imagem inesquecível. De uma simplicidade ímpar, o lugar é aconchegante e acolhedor. Ruas limpas, cidade ideal para se morar sem maiores badalações. É normalmente um ponto de partida para a visita a esta linda e maravilhosa região de Midi-Pyrénées, que envolve também passagem por Conques, Milau, Estaign, Belcastel, entre outras vilas consideradas das mais bonitas da França.

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Quando cheguei à Rodez, fiquei hospedado no Hotel Mercure em frente a Rosa Imponente. Meu quarto dava de frente para esta maravilha da arquitetura medieval. Durantes os dias que ali me hospedei a divina senhora, Notre Dame, me acordava exatamente às 5.45 para rezar para todos e admirar o maravilhoso pôr do sol às suas costas. Momentos extremamente comovedores.

O edifício, feito de arenito rosa, destaca-se graças a sua fachada ocidental, semelhante a uma fortaleza, e que fazia parte da muralha da cidade, mas também por causa de sua torre de sino. Esta torre elaborada com 87 metros de altura tem sido símbolo da cidade durante séculos. É de uma magnitude que espanta, mas ao mesmo tempo nos deixa boquiabertos.

A sua arquitetura militar mais parece um forte do seu lado principal, com pedras roseadas marcantes, levou três séculos (XIII a XVI) para ser construída o que é hoje uma das catedrais mais imponentes, no sul da França.

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No interior, os visitantes são maravilhados com os sete vitrais figurativos do artista Stéphane Belzère, onde a criação contemporânea combina com iconografia cristã tradicional. Sua estatuária medieval é de extrema beleza. Em todos os cantos da igreja encontram-se trabalhos de extrema qualidade artística.

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A catedral de Rodez está lado a lado com as estreitas ruas do comércio tradicional onde se misturam cheiros e negócios. Entre as lojas tradicionais, com pitorescos letreiros à porta, estão como vizinhos lojas de vinhos, padarias, ou lojas de chapéus e de pastelaria fina.

Se for visitada entre os meses de junho a agosto, o que não foi o meu caso, pois lá estive em abril, você poderá subir à catedral, decorada com gárgulas de pedras muito bonitas, e desfrutará de uma vista soberba da cidade. A visita deve ser marcada no Posto de Turismo de Rodez.

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As portas da catedral estão abertas aos visitantes, mas, se a visitar durante a missa de domingo, pode assistir ao efeito espetacular dos 3100 tubos do órgão da igreja. Talvez da próxima vez eu me deleite com esse som.

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A “Nossa Senhora Rosa” me marcou de maneira profunda, jamais esquecerei dos momentos que ao amanhecer corria ao seu redor chorando e agradecendo a oportunidade de abraçá-la. Notre Dame de Rodez rogai por nós.
x9400Paulo Edmundo Vieira Marques, Professor, Historiador e Escritor Medievalista

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Museu de Cluny – A Idade Média Preservada

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Chovia forte no dia 29 de abril de 2015, quando saí do Hotel Diana, pela parte da manhã, em direção ao Museu de Cluny. Caminhando nem percebia o frio e as dificuldades climáticas. Olhava para todos os lados admirando Saint German e Saint Jacques, maravilhosas e cativantes bulevares. Paris é mais bonita chovendo, ahhh, dizendo melhor; é bonita de qualquer jeito. Bem, talvez o dia cinzento contrastava com a minha enorme expectativa com relação ao magnífico prédio que iria adentrar. A cidade é repleta de museus. De arte, de ciências, históricos, da música, da moda, de todas as atividades humanas. Alguns atendem a interesses muito localizados, outros são imperdíveis. Entre estes está o Museu da Idade Média, mais conhecido como Museu de Cluny. Fica na região da Sorbonne, Quartier Latin, em um prédio construído no século XV por ordem de Jacques D’Amboise, abade de Cluny. A construção do prédio atendia a necessidades de hospedagem dos monges de Cluny*, que desde o advento da Universidade de Paris no século XIII mantinham um Colégio naquela região e até então ocupavam uma hospedaria modesta. A nova hospedaria recebeu o nome de Hotel de Cluny e além dos professores, noviços, abades, hospedou visitantes ilustres durante o período em que foi usada com a função de hospedagem. Sítio arqueológico único no coração de Paris, o Museu de Cluny testemunha da época romana, com as suas termas galo-romanas datadas do século I antes de Cristo e das suas duas salas com pé direito de 15 metros: o caldário, o cômodo aquecido e o cômodo refrigerado. Ao lado, outra maravilha arquitetônica: o casarão histórico dos abades de Cluny, datado do século XV. Construído em estile gótico, trata-se de uma residência excepcional, com as suas ricas fachadas esculpidas e o seu pátio interno. A capela e os jardins do local contribuem para dar um charme todo especial ao lugar, oferecendo aos visitantes que por ali caminham a tranquilidade e uma bela área verde em pleno centro de Paris.    

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No local escolhido para o Hotel de Cluny existiam restos de um antigo edifício romano, as Termas do Norte de Lutécia, cidade construída no século I na margem esquerda do Rio Sena. No século IV, para se defender das invasões de povos germânicos, os romanos construíram uma nova cidade na Ilha da Cité, que foi murada. As Termas do Norte foram abandonadas e perderam sua função.

O prédio do Hotel de Cluny foi construído mantendo partes das antigas termas e esta é uma das atrações para o visitante. O prédio do século XV é um raro exemplar da arquitetura residencial da época, e no mesmo local se encontram uma conservada sala de banho romana do século I, e restos de outras duas salas de banhos, estas na parte externa do prédio.

O Hotel foi confiscado pelo governo revolucionário em 1793 e passou a ser patrimônio do Governo francês. Foi arrendado em 1833 para Alexandre du Sommerard, colecionador de arte medieval, que ali instalou sua coleção e a ampliou. Após a morte de Du Sommerard o governo francês adquiriu a coleção e criou o Museu. A coleção inicial foi sendo completada com peças trazidas de vários locais e hoje é possivelmente o maior acervo de arte medieval no mundo.

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O Museu tem as dimensões certas para uma visita completa, sem levar o visitante à exaustão. A coleção é uma ampla amostragem de 15 séculos de arte, inclui esculturas e peças do período galo romano e passa pelos períodos românico e gótico. Uma das peças de grande valor histórico é o Pilar dos Nautas, coluna decorada do século I encontrada em escavações realizadas no século XVIII na Catedral de Notre Dame. A coluna, dedicada ao Imperador Tibério, foi elaborada por galo romanos em honra de Júpiter e representa tanto divindades romanas quanto celtas. É um documento em pedra da convivência entre o culto celta dos antigos gauleses e o culto romano. Também documenta a existência de um local de culto gaulês onde hoje se situa a Catedral. O acervo do museu incorpora muitos trabalhos em mármore e em marfim, vitrais medievais, pinturas de diferentes épocas da Idade Média e um grande conjunto de tapeçarias, com destaque para uma série de tapeçarias do século XV, A Dama e o Unicórnio. São seis tapeçarias com a representação de uma dama com um leão e um unicórnio, e uma aia em algumas das cenas. Cinco das tapeçarias representam os sentidos: o tato, o paladar, o olfato, a audição e a visão. Uma sexta tapeçaria tem a presença de todos os personagens e uma barraca com a inscrição “Mon Seul Desir”. Essa tapeçaria deu origem a uma vasta literatura interpretativa do significado da cena e da inscrição “Meu único desejo” e pode-se dizer, sem qualquer dúvida, que as tapeçarias estão entre as mais famosas do mundo. Outro ponto a ser destacado é a exposição de vitrais. São fragmentos montados de forma que a pessoa possa observar de perto os detalhes das obras. Isto é impossível nas catedrais pela distância entre o observador e os vitrais.

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Como espaço para um relaxamento depois da visita às coleções do Museu existe um jardim com área de cinco mil metros quadrados. O jardim é medieval no sentido de projeto, mas sua criação é quase do século XXI. Foi construído e plantado com base em pesquisas especializadas sobre estruturas, plantas ornamentais e medicinais da época. Uma das fontes está nas tapeçarias da Dama e o Unicórnio, que mostram plantas que foram introduzidas no jardim, concluído no ano 2000. É a chave de ouro da visita ao Museu.  O tempo parou para mim.

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Não conseguia sair daquele espaço maravilhoso. Chorava, enxugava as lágrimas, recompunha-me e continuava a admirar aquela beleza medieval preservada. Voltava a chorar, estava na hora de ir embora. Cluny, jamais te esquecerei. Distanciando-me meu coração se apequenava, mas enfim, tenho certeza, voltarei.

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*A partir do século X e até ao século XII, o mosteiro de Cluny celebrizou-se pela influência moralizadora de seus membros no seio da Igreja Católica, movimento que ficou conhecido como Reforma de Cluny. Juntamente com os movimentos reformistas liderados por São Bento de Aniane, pela Ordem dos Cartuxos e pelos monges da Ordem de Cister, conseguiram conter parte do relaxamento de costumes que havia invadido a vida monástica e eclesiástica, na Europa, à época, reflexo da intromissão da política e suas manipulações no seio da fé.

Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador, Escritor Medievalista

Este texto eu dedico a minha querida amiga Ana Laura Bandeira Lins Lunardelli, incentivadora e participante dos meus estudos e pesquisas. 

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Gente do Medievo – O Difícil Cotidiano de um Ferreiro do Século XI.

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É 1096, meu nome é Fray, um ferreiro em formação. Tenho 17 anos e tenho sido um aprendiz por cerca de dois anos. Eu sou o quinto filho, o caçula da minha família, e por questões financeiras meus pais não tiveram escolha, me colocaram no aprendizado de ferreiro. Mas ser um aprendiz não é um feito tão grande como poderia imaginar. Você pensaria que eu estaria aprendendo sobre a arte de ferreiro, mas para mim, tudo o que eu faço são inúmeras tarefas e o trabalho mais sujo. Não é só isso, sou maltratado diariamente pelos meus superiores, apesar de saber ler e escrever.

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Nós residimos em Londres. Nossa casa e a loja são perto do castelo para a conveniência dos cavaleiros que constantemente necessitam reparar as suas armaduras. Nesse exato momento várias pessoas adentram em nossa loja solicitando reparos em suas ferramentas, pois corre a notícia que o Rei William II ordenou a construção de paredões em volta da Torre de Londres para substituir a paliçada de madeira. Isso necessitará de instrumentos de ferro em bom estado.

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Iluminura de ferreiros trabalhando. Início do século XV. Nota-se a lady na forja.

Meu mestre disse que este trabalho é muito importante para a cidade, pois nós fornecemos muitas coisas para ela e o castelo. Por exemplo, um agricultor, o que ele pode fazer sem as suas ferramentas? Bem, ele ainda pode fazer toda a sua obra, mas seria menos eficiente e levaria mais tempo. Outro exemplo que ele me disse foi que sem as coisas que fazemos como poderíamos lutar em guerras ou batalhas contra inimigos sem armas e armaduras? Será que nós usaríamos os nossos punhos? É por isso que a arte de ferreiro causa certo impacto nessa terra. E de fato é verdade, para melhor ou para pior. Eu não sou o primeiro aprendiz que, o meu senhor, teve, ele é bem conhecido em toda a cidade e tem tido vários alunos que me antecederam. Eu ainda tenho um longo caminho a percorrer antes que eu seja libertado, espero que com a graça de Deus e os ensinamentos do meu mestre eu consiga sobreviver de maneira digna e produtiva.

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Bíblia Holkham datada nos anos 1330. Ferreiros e juntamente com uma mulher trabalhando.

Eu acordo todas as manhãs em torno das seis horas, antes do meu senhor acordar e deixo tudo preparado para o nosso longo dia de trabalho. Depois que nós, eu e o meu mestre, comemos pão e tomamos leite, começamos o trabalho. Paramos para o almoço e reiniciamos mais um dia longo, duro e exigente fisicamente. Enquanto estou no trabalho, na maioria das vezes o que eu faço é limpar os tanques e quebrar o carvão. Tem sido assim desde que eu comecei e eu acho que meu mestre não tem a menor intenção de mudar essa rotina.

Ao final do dia eu estou todo dolorido, mas depois ainda tenho que limpar toda a bagunça. Como, pode-se ver o trabalho de um ferreiro não é fácil, pois você é obrigado a trabalhar no calor da forja e sujar as mãos com o carvão, na verdade, não apenas as mãos, suas roupas ficam toda esfarrapada. Recebo um jantar, quando as minhas tarefas são bem executadas. Vou logo dormir, porque eu já sei o que está reservado para amanhã, com exceção dos domingos, que é quando a cidade inteira vai para a igreja. É o único dia em que eu posso fazer uma pausa de todo este trabalho estressante que eu tenho que lidar com os outros seis dias.

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Ferreiro no Trabalho – Blacksmith at work – Harley 6563 f. 68v.

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Ultimamente temos recebido inúmeros clientes de todos os cantos. A maioria deles são cavaleiros ou mercenários que nos procuram para reparar armas e equipamentos. Eles vêm de diferentes regiões, e a maioria deles disseram que estão se dirigindo para Jerusalém. Talvez isso se deva as Cruzadas que o Papa pediu. Parece que a dinastia seljúcida conquistou a Terra Santa e o Santo Pontífice quer lutar e recuperar o nosso território. Para motivá-los, o Papa disse que quem participar e ajudar nessa causa, ficaria livre das indulgências. Bem, a empresa está fazendo o melhor pela causa.

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Vitrais da Catedral de Chartres, França – Ferreiros no trabalho.

Fonte: Medieval Manuscripts Bodleian University

Tradução do Inglês para o Português:  Professor e Historiador Paulo Edmundo Marques

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Castelo de Burg Eltz – O Parceiro das Nuvens

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Uma joia nas montanhas. Guardião do Vale. Mágico privilégio de quem o fite. O céu é companhia de suas exuberantes paredes. O Castelo Eltz é esplêndido, espetacular! Um dos castelos mais bem situados e mais bem preservado da Alemanha e que está nas mãos da mesma família há 800 anos. Está localizado em um cenário maravilhoso, dentro de um “abismo”, rodeado por uma paisagem montanhosa, atraente e majestosa, como um castelo de contos de fadas.

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A construção de castelos na Idade Média começou nos séculos IX e X. Até este período, as construções eram protegidas por muros e cercas, predominantemente feitas de madeira. Entretanto, a ideia de proteção a partir de muros de pedras deu novo impulso à arte de erguer castelos. É neste contexto que surgiu o Burg Eltz. Sua localização é estratégica, já que fica entre o rio Mosel, uma das mais importantes rotas de comércio, e a região do Eifel.

 O Burg Eltz, construído no topo de uma montanha, fica a 70 metros acima do nível do rio que deu nome à fortaleza (Eltz). A construção levou em consideração a geografia do terreno. Diferente de outros castelos da Alemanha, alterados com o tempo, o Eltz permanece intacto há séculos graças à diplomacia de seus proprietários, que preferiram as palavras à guerra.

O Castelo de Eltz (em alemão Burg Eltz), situado por trás de Wierschem, nas proximidades da cidade de Münstermaifeld, no Estado da Renânia-Palatinado, é um dos mais imponentes, intrigantes  e belos castelos da Alemanha. Está situado no vale do Eltz, na separação de Maifeld com a frente do Eifel. Juntamente com o Schloss, o Burg Eltz é a única construção na região Maifeld-Eifel que nunca foi capturada ou destruída, tendo sobrevivido intacto às guerras dos séculos XVII e XVIII, assim como às convulsões sociais causadas pela revolução francesa.

A história completa da construção do castelo se estende por mais de 500 anos. Todos os estilos, do românico ao barroco, se fundem e formam um conjunto simétrico. No total, o que o visitante observa é um grupo de torres “residenciais” agrupadas ao redor de um pátio interno. Mais de 100 integrantes da família proprietária do castelo habitaram os mais de cem quartos.

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Durante o período romântico, com o interesse voltado às coisas medievais, o conde Karl zu Eltz se ocupou em restaurar o castelo da família. O trabalho, começado em 1845, seguiu até 1888. Na restauração, a arquitetura existente foi respeitada. Um verdadeiro e genuíno trabalho de renovação e restauração. O Burg Eltz se manteve como propriedade de uma mesma família por mais de 800 anos.

Os atuais proprietários são a 33ª geração da família Eltz. Para ter acesso ao castelo, é preciso descer uma ruela, que se torna uma cansativa subida após a visita ao Eltz. E como os locais eram muito religiosos, transformaram o trecho em uma Via Crucis, com uma estação a cada 200 metros.

 Parece que o interesse estratégico deste local no curso inferior do Elz (ou Eltz), afluente do Mosel, terá sido um fator determinante para a construção desse primeiro castelo-forte, provavelmente no início do século XII. Foi, assim, elevado junto do referido rio – desde sempre uma das vias comerciais mais importantes – e num lugar onde o acesso ao fértil Maifeld era dos mais fáceis. A localização permitia vigiar de dois lados o acesso ao vale do Eltz, assim como a via que ligava o Maifeld ao Mosel.

O nome Eltz aparece pela primeira vez referido numa carta de doação de Frederico Barbarossa, na qual “Rudolphus de Elze” aparece como testemunha. A tardo-românica torre de menagem Platt-Eltz e vestígios das casas residenciais românicas estão preservadas até hoje.

O pico rochoso de forma elíptica, com 70 metros no seu ponto mais elevado, banhado em três lados pelas águas do Eltz, forma as fundações do conjunto do palácio fortificado que obedecendo às contingências naturais está construído numa planta oval. Isto causou, em parte, o esquema invulgar dos espaços individuais.

Antes de 1268, os irmãos Elias, Wilhelm e Theoderich procederam à primeira divisão do património, ou seja, à divisão do castelo e dos domínios que dele dependiam. Foi então que apareceram três linhagens principais da Casa de Eltz, as quais tomaram os nomes dos seus brasões – Eltz do Leão de Ouro (Eltz vom goldenen Löwen – Kempenich), Eltz do Leão de Prata (Eltz vom silbernen Löwen –Rübenach) e Eltz dos Chifres de Búfalo (Eltz von den Büffelhörnern – Rodendorf) – que ainda hoje se refletem nos nomes das diferentes partes do castelo. Desde então, o Burg Eltz foi, tipologicamente, um castelo detido pelos co-herdeiros, onde viviam juntas várias linhagens da Casa de Eltz numa comunidade de herança e de habitação. “Cartas de paz do castelo” asseguram uma co-habitação pacífica entre os co-herdeiros, fixando os seus direitos e deveres, assim como as modalidades de administração e manutenção do castelo. A mais antigas dessas cartas, que foi conservada, data do ano de 1323. Os co-herdeiros (“Ganerben”, em alemão antigo“ganarpeo”) são membros de uma comunidade de herdeiros que co-habitam em um bem herdado dividido. A comunidade “de pote e de arroto” não era a regra. Os co-herdeiros viviam separadamente com base na divisão do usufruto.

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 No início século XIV, o príncipe-eleitor de Trier, cavaleiro Balduin von Luxemburg, tio de Carlos IV, tratou de consolidar a unidade, a paz territorial do Eleitorado de Trier em torno das cidades de Trier, Coblença e Boppard. A nobreza imediata livre, rica e comn posses, opôs-se à política territorial do príncipe-eleitor. Foi então que, no dia 15 de junho de 1331, as comunidades de co-herdeiros dos Burg Waldeck, Burg Scönecken, Ehrenburg (ambos, os três situados no Hunsrück) e Burg Eltz concluíram uma aliança defensiva e ofensiva. Além das guarnições dos seus castelos, concordaram em levantar contra o príncipe eleitor um total de 50 cavaleiros fortemente armados.

No mesmo ano, Balduin tratou de esmagar esta liga de cavaleiros e mandou edificar num pico rochoso, em frente ao Burg Eltz, um grande castelo de cerco, o Burg Trutzeltz (também chamado de BalduineltzBaldeneltz ou Neueltz): uma torre de menagem de planta quadrada com dois andares, acolhendo apartamentos e  elementos característicos das pequenas fortalezas de Balduin – com caminho de ronda, entrada em ogiva com duplo portal e liças em três dos lados. De lá, mandou bombardear o Burg Eltz com recurso a catapultas que lançavam bolas do gênero daquelas que se encontram ainda hoje no pátio interior do castelo. Com o corte das vias de acesso que permitiam o aprovisionamento do castelo, os cercados de Eltz foram obrigados a render-se após um cerco de dois anos. A capitulação dos três castelos do Hunsrück foi obtida por meios semelhantes. Em 1333, os senhores de Eltz pediram a paz. No dia 9 de janeiro de 1336, a “Paz de Eltz” foi concluída e a “guerra de Eltz” teve fim. A aliança defensiva e ofensiva foi dissolvida e o Burg Trutzeltz permaneceu nas mãos do príncipe eleitor Bauduin que, em 1337, fez de Johann von Eltz o seu burgrave* hereditário. Em 1354, o próprio Imperador Carlos IV deu o castelo em feudo ao príncipe eleitor Balduin e confirmou a doação a Boemund, seu sucessor. Assim, os senhores de Eltz (cavaleiros livres de nobreza imediata de origem dinástica) tornaram-se vassalos dependentes do Eleitorado de Trier e ficaram reduzidos a receber em feudo o Burg Eltz, assim como o Burg Trutzeltz, das mãos do príncipe eleitor. Em toda a história do Burg Eltz, esta guerra permanece como o único caso militar importante.

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No século XV, seguiu-se um período de intensa atividade arquitetônica que conduziu, em 1472, sob Lancelot e Wilhelm do Leão de Prata, ao acabamento da casa Rübenach, no lado oeste (o nome Eltz-Rübenach vem do bailio de Rübenach, perto de Coblença, do qual Richard do Leão de Prata tinha feito a aquisição em 1277)

Na diversidade arquitetônica que atinge o visitante desde a sua entrada no pátio interior, destaca-se particularmente a fachada da casa Rübenach virada para este pátio: As torretas em secções de madeira e de planta poligonal, o corpo-avançado em enxaimel, restaurado, de linha despida e severa, repousando sobre duas colunas de basalto e encimando a porta de entrada da casa e, sobretudo, o encanto do estilo final do gótico do enxaimel abrigando uma capela.

Enfim, o lugar é de prender a respiração, os sentidos ficam fora de órbita, todos os estilos arquitetônicos reunidos em um lugar mágico e exuberante.

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* no Sacro Império Germânico, título do comandante militar de uma cidade ou praça-forte; burgrávio.

Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista.

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Os Leões de Veneza – A Santa Proteção de São Marcos

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Veneza, maravilhosa, Veneza, sempre.

“Se eu tivesse que encontrar uma palavra que substituísse “música”, eu só conseguiria pensar em Veneza.”
– Friedrich Nietzsche 

“Veneza: sua existência não é apenas triunfo da engenharia;
Deus a colocou em equilíbrio…acredite!!!
Ninguém sai de Veneza indiferente”. 

A cidade foi formada em pequenas ilhas, dunas de areia da laguna de Veneza, a noroeste do mar Adriático. Habitantes de cidades próximas logo se refugiaram lá para se proteger dos bárbaros que vinham tomando conta da Europa. Foi uma das cidades mais importantes da Europa, com uma história rica e um império de influência mundial comandado pelos doges, os líderes da cidade. Graças à localização privilegiada no meio da rota entre o Oriente e o Ocidente, excelentes navegadores e poderio militar, a cidade tornou-se um próspero centro mercantil e naval. Tornou-se uma potência comercial a partir do século X, quando sua frota já era uma das maiores da Europa. O historiador Fernand Braudel classificou-a como a primeira capital econômica do Capitalismo. O patrono da cidade é San Marco (São Marcos) o grande navegador que deu nome a Piazza San Marco, uma das mais famosas do mundo.
Hoje é Patrimônio da Humanidade pela UNESCO. Dos muitos monumentos e locais turísticos existentes, destacam-se a imponente Basílica de São Marcos, na Piazza San Marco, a famosa Ponte de Rialto sobre o Canal Grande, construída em 1588 segundo projeto de Antonio da Ponte, o Campanário, a Ca’ d’Oro, o Palazzo Ducale e numerosas igrejas e museus.

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Em 828, dois mercadores trouxeram de Alexandria para Veneza as relíquias do Evangelista São Marcos. Desde então, passou a ser o padroeiro dessa encantadora cidade e seu símbolo, o leão alado, marca os prédios, as ruas e até os objetos ornamentais da “rainha do Adriático”.
A cidade de Veneza, conhecida em todo o mundo pelos seus canais, pontes, palácios e tantas outras maravilhas, deve muito de sua merecida fama a seu padroeiro, São Marcos. Caminhando ou navegando por suas ruas encantadoras, pode-se contemplar por toda parte, até nas gôndolas, o emblema da cidade: o leão alado com a Sagrada Escritura, representação do santo Evangelista. O que tem a ver com a outrora “Aristocrática e Sereníssima República de Veneza” esse grande Santo que viveu e morreu em terras muito distantes, no Oriente?

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Segundo uma lenda vêneta, numa noite fria de há quase dois mil anos, um pequeno barco proveniente da Aquiléia, fugindo do mau tempo, aportou numa ilhota de uma laguna pantanosa do Mar Adriático. Exaustos, tripulantes e passageiros desembarcaram e abrigaram-se nas cabanas dos pescadores que lá viviam. Entre os viajantes estava um jovem de nome Marcos. Contrastando com o lúgubre local e a tristeza daquela noite, ele contava com vivacidade aos seus companheiros de navegação e aos nativos uma história surpreendente a respeito de um homem que se dizia Filho de Deus e viera à terra para revelar a Boa Nova. Todos ouviam com interesse e curiosidade. Cheio de entusiasmo, narrou- lhes os milagres operados por Jesus de Nazaré. Falou-lhes de seu mestre, Pedro, ele também pescador outrora. Explicou-lhes que o Messias, morrendo numa Cruz, salvara todos os homens. Impressionados, seus ouvintes não viam correr o tempo, mas, afinal, vencidos pelo cansaço, todos se recolheram. Também o jovem narrador procurou um local digno para repousar e logo adormeceu. Em sonhos, ouviu uma voz que lhe dizia: – Marcos, Marcos, olha ao teu redor. Nesta ilha em que te encontras surgirá um dia uma grande e bela cidade, que será uma das maravilhas do mundo. Nela tu encontrarás o teu último repouso.

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Deixando de lado a lenda, todos sabem que Veneza foi construída sobre um conjunto de ilhotas situadas no centro de uma laguna do Mar Adriático. São Marcos é o Padroeiro da cidade e seus restos mortais aí repousam na esplêndida Basílica edificada em sua homenagem.
O que os leitores talvez não saibam é como lá foi parar o corpo do glorioso Evangelista, martirizado em Alexandria, no Egito. No final do ano 827, ou início de 828, chegou a essa cidade um grupo de mercadores venezianos, com a difícil incumbência de levar a qualquer custo as relíquias do Santo para Veneza.
Dois deles – Buono da Malamocco e Rustico da Torcello – travaram relacionamento com um monge de nome Staurazio e um sacerdote chamado Teodoro, os quais eram os guardiões do Santuário de São Marcos. E por meio deles foram informados de que o governador árabe de Alexandria não escondia sua intenção de demolir as igrejas cristãs a fim de utilizar o mármore de suas colunas na construção de um palácio. Com isso, as preciosas relíquias corriam sério e iminente risco de serem destruídas. Era preciso agir com habilidade e decisão, qualidades que nunca faltaram aos venezianos!
Os dois mercadores convenceram os guardiões a irem com eles para Veneza, levando as relíquias. Sem perda de tempo, retiraram o corpo de São Marcos – colocando em seu lugar o de Santa Cláudia, que jazia em um túmulo vizinho – e o levaram para o navio. Para despistar a fiscalização alfandegária, depositaram os restos mortais do Santo num grande cesto de vime, cobrindo-o com folhas de couve e postas de carne suína, produto muito malvisto pelos adeptos da religião islâmica.

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Porém, de onde menos eles esperavam, surgiu-lhes um grande risco. Pouco antes da partida, uma onda de perfume intenso difundiu-se pelo Santuário de São Marcos e pela cidade de Alexandria, despertando a atenção dos habitantes.
Acorreram todos à igreja, mas, vendo que lá estava, no local de costume, o corpo de “São Marcos”, tranquilizaram-se e cada qual retornou à sua casa.
Restava agora um só obstáculo: ultrapassar a alfândega portuária. Apontando para o cesto de vime, disse um dos mercadores: “Kanzir, kanzir” (carne suína). Fazendo um gesto de horror, os agentes liberaram a passagem sem qualquer verificação.
Após uma viagem repleta de aventuras, na qual foi necessária uma aparição do Santo para salvar o navio do naufrágio, este atracou no porto de Olivolo, onde o bispo local e o doge Justiniano Particiaco receberam com todas as honras as sagradas relíquias. Era o dia 31 de janeiro de 828. Foram elas guardadas provisoriamente num aposento do Palácio Ducal, à espera de ser edificada a esplendorosa Basílica destinada a acolhê-las em caráter permanente.
E assim São Marcos passou a ser Padroeiro de Veneza.

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  • Paulo Edmundo Vieira Marques – Historiador, Professor, Escritor Medievalista,

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Catedral de Chartres – Os Caminhos da Fé e da Luz

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Saí de Paris às 8:34, pressentindo que algo de maravilhoso me aguardava, a fé e a paz. A estação ferroviária, de onde o trem inicia o trajeto, por sinal muito bonito, para Chartres, é a Gare Montparnasse, não me sai da minha mente aquele caminho. É possível distinguir suas torres desiguais que representam o Sol e a Lua bem antes de chegar ao pequeno vilarejo de Chartres, a 170 quilômetros de Paris. Erguida numa região quase plana, a Catedral levanta-se como uma montanha feita de pedra cinza que pode ser vista da janela do trem. 

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Quando falamos sobre Chartres, estamos na realidade falando da Catedral de Chartres. Belíssimo edifício gótico do século XIII, ponto de partida para a peregrinação até Santiago de Compostela. A catedral se encontra ao lado da estação ferroviária de Chartres. Um pequeno aclive de ruas medievais nos leva ao seu encontro. No trajeto, diante de um frio intenso, chuva fina e frio, quase neve, meu coração pressentia que alguém me chamava. Induzia-me para a fé e a paz.

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Chartres é uma das primeiras catedrais da França. No final do século XII, graças ao apoio da burguesia e da classe trabalhadora, os reis conseguiram retomar a sua autoridade. Enfraquecido o poder feudal vai aos poucos desaparecendo. A população passa a ter maior influência na vida pública, da qual tinha sido até então uma mera espectadora. Eufóricos diante da própria importância, os habitantes de cada região sentem a necessidade de demonstrar sua emancipação. A Catedral será o símbolo da sua vitória. Aí se realizarão não apenas os atos religiosos, mas as atividades comunitárias de todo o grupo, será a casa do povo. Não mais cheia de esculturas e desenhos tenebrosos, mas alta, imponente, iluminada. Que as suas torres pontiagudas tentem atingir as nuvens. Livre do fim do mundo, o povo é animado por um novo sopro de fé. As paredes de seu templo devem deixar entrar a luz do sol em múltiplas cores que lembrem a presença divina. Da necessidade de construir catedrais que correspondessem à euforia e ao misticismo do povo surgiu a arquitetura gótica. As primeiras foram construídas na França, ao redor de onde se encontra a cidade de Paris, uma das primeiras regiões da Europa a erradicar o feudalismo. 

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A catedral atual foi construída entre os anos de 1194 a 1250. Ela é a última versão das quatro igrejas anteriores que existiam ali e que foram destruídas em incêndios devastadores. Chartres foi erguida sobre a penúltima igreja, que era em estilo românico e que hoje é mais conhecida como igreja baixa ou cripta. Tanto a construção românica que serve de alicerce como a própria catedral foram construídas dentro das proporções harmônicas da geometria sagrada e dos números pitagóricos, uma herança vinda dos antigos gregos que foi reabilitada no século XI com Chartres. A geometria sagrada de Pitágoras era baseada na música, e não na arquitetura. Por isso é possível dizer que Chartres é uma composição musical feita em pedra e vidro por autores desconhecidos que sabiam como provocar a ressonância harmônica entre as forças sutis e o ser humano por meio do uso consciente da geometria.

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Quando foi reinaugurada em 1250, Chartres imediatamente chamou atenção de toda a Europa. A construção era o que de mais moderno existia em matéria de arquitetura e uma absoluta novidade para a época. Era a segunda igreja do continente a ser construída no estilo gótico (a primeira foi a pequena St. Denis, em Paris). Durante a Idade Média, milhares de peregrinos chegavam ao pequeno vilarejo para visitar a catedral em busca de conforto espiritual, mas também de cura do corpo físico, pois a Chartres tinha a fama de operar milagres. Ao contrário de hoje, eles não entravam pela porta principal do lado oeste, mas iniciavam o caminho penetrando na cripta, alguns metros abaixo do piso da catedral, onde estão erguidas as paredes da igreja românica original. E os viajantes ficavam ali por horas ou dias até se sentirem prontos e purificados para adentrar na igreja, como num processo iniciativo de expurgação e cura dos seus sofrimentos. Era como um homem novo que o peregrino entrava na catedral pela primeira vez, pronto para um contato com um plano espiritual anteriormente inatingível.

É justamente na cripta que se esconde o primeiro grande mistério de Chartres, as correntes telúricas (energias terrestres) sobre as quais a catedral teria sido fundada. Meu coração quando visitou a cripta de Chartres disparou, como se me purificando.

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Alguns autores apontam Chartres como uma colina já considerada sagrada pelos celtas, povo que habitava o lugar bem antes da época cristã. Situada numa confluência de veios subterrâneos de água organizados artificialmente sob a forma de um leque aberto, a catedral se assenta sobre um mound, palavra céltica que designa uma colina onde se concentram forças telúricas de grande potência, chamadas por eles dewouivre (ou vril). “O mound sobre o qual a catedral de Chartres está construída era um local sagrado muito antes do cristianismo”, diz Tim Wallace Murphy, autor do livro O Código Secreto das Catedrais. “Ele era sagrado muito antes que os druidas lá chegassem, e já era um centro de peregrinação na época, e desde então”, afirma. Como os “vapores” que emergiam de templo de Delfos, na Grécia, e que colocavam as pitonisas num diferente estado de consciência, acreditava-se que as correntes de wouivre do mound de Chartres atuavam no ser humano como centelha inicial de um processo transformador de consciência.

De acordo com alguns especialistas do assunto, o lugar já deveria ser conhecido como uma espécie de Stonehenge desde o Neolitico. Os canais subterrâneos de água foram construídos de forma a intensificar conscientemente a energia natural que brotava da terra. “Esses são lugares onde essa força telúrica extremamente poderosa, ou Spiritus Mundi, pode ser detectada. O Spiritus Mundi é tão potente que é capaz de despertar o homem para a vida espiritual.

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A cripta é dividida entre muitas capelas e altares. Escura, essa igreja parcialmente subterrânea recebe a pouca luz que vem de fora através de minúsculas janelas. Hoje a cripta é iluminada artificialmente, mas não com muita luz, para preservar um sentido de introspecção e recolhimento. É sombria e, para alguns, assustadora.  Uma das duas jornalistas que está comigo nessa visita começa a passar mal e se apóia no meu braço. A guia fala muito rapidamente, numa sucessão de dados históricos e culturais. Sua voz começa a não ter mais sentido para mim. Quando nós nos dirigimos ao poço que fica no meio da cripta, eu percebi que minha mente estava quase vazia de pensamentos. Embora a água dos veios do poço tenha sido desviada há séculos e ele seja basicamente um poço comum muito profundo, mesmo assim a energia se manifesta intensamente. Não é raro o visitante sentir-se mal por causa da atuação poderosa da wouivre telúrica ainda presente. Segundo alguns e, eu senti pessoalmente as correntes telúricas são muito fortes lá embaixo. Aquele é um dos pontos magnéticos mais fortes da Terra. Ele faz parte da cura que as pessoas buscavam na Idade Média. As correntes intensas transmitem a sensação de se estar sendo puxado para baixo.

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Possivelmente a cripta atuava como purgatório, onde o peregrino se livrava de suas dores, males e sofrimentos.  Eles eram, literalmente, sugados para baixo pela terra.  

Na cripta, além de rezar para a imagem da Virgem Negra, como era conhecida nos tempos medievais (uma antiga cópia substitui atualmente a original, queimada num incêndio durante a Revolução Francesa), os peregrinos bebiam a água do poço subterrâneo, considerada milagrosa. Isso quer dizer que, além da purificação do espírito, eles passavam pela cura do corpo, e sua consequente mudança de paradigma energético por meio da ingestão da água dos canais subterrâneos. Ali, rezavam várias missas por dia, na penumbra e sob as graças de Notre Dame-sous-terre (Our Lady of Underworld).

As Madonas Negras, como a de Notre-Dame-sous-terre, são veneradas em muitas igrejas da Europa. A origem desse culto é antiquíssima.

A tradição da veneração da Madona Negra em grutas e criptas é aceita como um culto pré-cristão. Era muito popular entre os druidas (os sacerdotes celtas) que habitavam parte da Gália, onde atualmente existe a França. Para eles, a Virgem Escura representava a força da natureza escondida sob a terra durante o inverno, que posteriormente explodiria em flores e frutas durante a primavera-verão. A Madona Negra também materializava a profecia celta que dizia que uma Virgem Sagrada e seu Divino Filho, o Salvador do Mundo, seriam muito importantes no futuro.

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Mais de 500 esculturas de Madonas Negras foram descobertas na Europa, geralmente escondidas em grutas e cavernas. A imagem de Chartres, por exemplo, é muito parecida com a da igreja de Rocamadour, mais ao Sul da França e a de Nossa Senhora de Montserrat, na Espanha. Notre Dame-sous-terre também era conhecida dos romanos antes de Cristo e foi descrita pelo imperador Júlio Cesar como a Virgini Pariturae, ou a Virgem prestes a dar à luz, cerca de 50 anos antes do nascimento de Jesus. Nessa época, ela era adorada pelos druidas no lugar sagrado de Carnutum, entre os rios Eure e Loire, exatamente na colina onde hoje está erigida Chartres.

Provavelmente de origem egípcia – Ísis também era conhecida como Virgem Negra, e mãe de Hórus, o Sol – a tradição celta desse culto se espalhou pelo solo gaulês e seus altares antecedem inúmeras igrejas católicas atuais hoje dedicadas a Nossa Senhora. Imagens famosas de Madonas Negras conhecidas como Notre Dame-sous-terre se acham presentes na França, Itália, Espanha, Alemanha e Polônia. 

Os cavaleiros templários, muito ligados à história da construção de Chartres, também abraçaram a veneração a Virgem Negra, mas por outros motivos.  De acordo com alguns autores, a Madona Negra também representava a senhora que está oculta, ou Maria Madalena, protetora deles. Nesse oceano de especulações e teorias, é bem possível que esse sincretismo realmente tenha ocorrido em Chartres nos tempos iniciais da cristianização da Gália. Mas se associação da imagem com Maria Madalena é incerta, com certeza há um vínculo estreito entra a catedral e a Ordem dos Templários. Na cripta, vários vitrais em pequenas janelas ainda ostentam a cruz templária e Bernard de Clairvaux, um dos inspiradores da Ordem, foi um dos grandes incentivadores da construção da catedral.

Portanto, disfarçados sob a aparência de uma intensa devoção à Nossa Senhora, mãe de Jesus, existe a possibilidade de que vários cultos e crenças fossem misturados sob o olhar muitas vezes complacente da Igreja. Mas nem sempre essa convivência foi pacífica. Os padres se tornavam cada vez mais incomodados e resistentes com os cultos de origem pagã praticados dentro dos muros das catedrais. Mas aos poucos, a devoção à Madona Negra transformou-se na devoção à Nossa Senhora, mãe de Jesus, e continuou intensa por séculos e séculos.  

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Outra imagem de Madona Negra famosa na catedral de Chartres é a de Notre Dame-du-Pilier. Ela foi colocada em cima de uma coluna dentro da igreja para substituir a imagem destruída num incêndio dentro da cripta (a imagem que existe hoje é uma antiga cópia dela).  Na verdade, a imagem policromada de Notre-Dame-du-Pilier era originalmente branca (era conhecida como Notre Dame-la-Blanche) e talvez ela tenha sido colocada dentro da parte de cima da catedral para enfraquecer o culto à Madona Negra que se realizava abaixo na cripta. Mas, por ironia, com a passagem do tempo Notre Dame-la-Blanche também se tornou… negra, porque foi escurecida pela fumaça das velas dos fiéis. E assim eles continuaram a devoção a Madona Negra na figura dela. 

A imagem de Notre-Dame-sous-Pilier em Chartres foi colocada em cima de uma coluna, num lugar de muita energia e devoção. Considerada uma Virgem Negra por séculos, ela recebeu recentemente uma pátina branca que devolveu a cor original à imagem.

Como outras virgens escuras, inclusive Nossa Senhora da Conceição Aparecida (que é a santa padroeira do Brasil), Notre Dame-sous-Pilier recebeu uma vestimenta feita de tecido, que deu à imagem uma aparência piramidal em forma de sino. Assim ela é descrita pelo autor de O Código Secreto das Catedrais. ”A Virgem foi vestida de acordo com a tradição, com mantos pesados e ornamentados, formalmente modelados como um triângulo. Se ficarmos em frente do pilar onde ela está, é possível se detectar um nível tangível de energia, um lugar de poder dado por Deus onde a vibração é tão baixa que pode induzir uma sensação de desfalecimento, indicando que esse também é um ponto de transformação espiritual”

Mas depois de uma reforma recente da catedral, em 2012, a imagem de Notre-Dame-du-Pilier recebeu novamente a pátina branca original, e os vestidos vaporosos dela foram retirados. Atualmente, ela mais parece uma boneca colorida, mas o ponto energético diante dela provavelmente continua a atuar como antes. Mas de acordo com contatos com peregrinos eles não gostaram nem um pouco das mudanças na santa.

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Mais tarde, eu entrei no espaço reconfortante da catedral com o coração leve, como os antigos peregrinos. Eu dei um suspiro de alívio. Meus olhos se acostumaram aos poucos com esse outro tipo de penumbra, agora repleta de cores luminosas, os vitrais me encantavam, e energias celestes, como afirma a tradição de Chartres. A catedral é escura para que os vitrais dela se tornem mais nítidos, um espetáculo para os olhos e para o coração. Naquele momento, o templo parecia um grande útero iluminado por joias cintilantes. Chegava agora o momento certo de encontrar o labirinto.

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De acordo com alguns livros e autores, o labirinto é uma viagem rumo ao centro do ser feita exteriormente e interiormente. O constante andar em círculos faz rapidamente o cérebro perder referências de tempo e espaço. Em poucos minutos, é possível se caminhar em outra dimensão temporal e espacial nas voltas do círculo. E ao tentar encontrar a rota certa com muita concentração, podem surgir muitos insights paralelos sobre nossa vida.

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O nosso percurso fatalmente chegará ao centro. Nesse ponto, segundo medidas feitas por especialistas em radiestesia, está presente um alto nível de vibração energética, que pode fazer o corpo oscilar levemente para frente e para trás. É no centro do labirinto que, em prumo, nos tornamos um elo perfeito e o céu e a Terra. “Tanto no labirinto de Creta quanto no de Chartres, só um caminho conduz ao centro. Reencontrei alguns caminhos perdidos, a fé de Chartres me conduziu a uma enorme paz, que durante anos a tinha perdido. Por alguns momentos percebi que é possível encontrá-la desde que você realmente a deseje.

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Andei na direção do centro do labirinto. E fiquei ali, silencioso, por uns quinze minutos. Realmente senti um influxo de energia que vinha de cima, e me banhei nessa força iluminadora por algum tempo, inerte, mas muito feliz. Depois, eu agradeci interiormente e me dirigi ao altar. Rezei silenciosamente e agradeci comovido “Abe Deo Vincit Semper Gladius Auxilius Nobis” Fiz, com todo o meu coração, senti-me peregrino possuído com a luminosidade de Chartres para voltar ao mundo e irradiar a luz da bela Catedral.

x6001Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador, Escritor Medievalista.

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A Magia do Monte Saint Michel “la merveille”

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O Monte Saint Michel, ilha rochosa do noroeste francês, tem o apelido de “la merveille” (a maravilha). O motivo é claro: o monastério e a abadia medievais, homenagens ao Arcanjo São Miguel, dão um ar mágico e encantador ao local. Tombada como Patrimônio Cultural da Humanidade pela Unesco em 1979, a ilhota é o terceiro ponto turístico mais visitado da França, perdendo apenas para a Torre Eiffel e o Palácio de Versalhes. Por ano, mais de três milhões de turistas aproveitam as belíssimas vistas das edificações históricas e das mudanças da maré.

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A história do lindo lugar remonta ao século VIII. Em 708, quando o Bispo de Avranches (Aubert), após uma visão milagrosa, mandou construir sobre o Monte Tombe, nome original do lugar, um santuário em homenagem ao Arcanjo Miguel. O santuário se tornou ponto de peregrinação, fazendo um eixo religioso com outras cidades francesas como Carcassonne e Avignon. A pequena capela sobre o rochedo se tornou ponto de peregrinação e deu origem a uma vila medieval. Ao mesmo tempo, monges beneditinos se mudaram para o local e deram início a um monastério. A igreja ganhou novas instalações no século XI e foi ampliada no século XII. Apenas no século XIII-com a ajuda de Felipe Augusto, então rei da França-o local recebeu fortificação e foi dado início à construção da atual abadia. O Monte Saint Michel se tornou uma fortaleza impenetrável. Resistiu a todas as tentativas de invasão dos ingleses na Guerra dos Cem Anos. Os cavaleiros franceses sitiados no interior da abadia contaram com a formação geográfica e com a fortaleza a seu favor que é um exemplo de arquitetura militar.

Na ilha de pedra granítica, localizada na divisa entre a Normandia e a Bretanha, encontra-se uma das mais incríveis obras do mundo. Um ícone do medievo. Diferente do que se imagina à primeira vista, o Monte Saint Michel não é um castelo. Lá nunca viveram reis e rainhas, mas sim monges beneditinos e peregrinos. A região murada abriga um vilarejo medieval, um mosteiro e uma magnífica abadia que dá nome ao monte. Tudo rodeado por um maravilhoso fenômeno natural que atrai milhares de visitantes: as maiores marés da Europa. O Monte Saint Michel é ainda mais imponente diante da maravilhosa paisagem natural, ainda mais quando se percebe que ele é a única construção em meio à imensidão da baía. 

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Andar por dentro dos muros do Monte Saint-Michel é como se sentir parte dos cenários de filmes medievais. O local preserva características de época e será difícil não se transportar para muitos séculos atrás. O momento talvez seja interrompido apenas pelos insistentes cliques dos milhares de turistas que todos os dias percorrem as vielas intramuros. Ainda assim, bastará fugir da rota principal, ou mesmo permanecer por lá até mais tarde, para ter a sensação de que Saint-Michel existe só para você. Se o horário permitir e o dia for de maré, procure um lugar bem alto para ver o retorno das águas. A depender da estação do ano, a primeira onda chega junto com o pôr do sol, o que torna o espetáculo ainda mais emocionante.

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Visitar o Monte Saint-Michel é se perder por horas em paisagens espetaculares, becos fantásticos, jardins encantados e muito sobe e desce de escadas. Você poderá entrar no vilarejo medieval e curtir cada um dos mirantes, as pequenas passagens entre lojinhas de souvenirs, restaurantes tradicionais e as casas dos poucos felizardos que moram por lá. Quem tem o privilégio de conhecer o Monte Saint-Michel, “a maravilha”, jamais o esquecerá. O impacto do medievo os tocará profundamente e lhe fará melhor posteriormente, Saint Michel te protegerá ainda mais.

x5686Professor, Historiador Paulo Edmundo Vieira Marques

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Sainte Chapelle – O Auge do Gótico

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Com mais de setecentos anos de existência, a Sainte-Chapelle é uma das construções que mais encantam os visitantes que nela tem a oportunidade de adentrá-la. Obra-prima do estilo gótico, ela é testemunha do talento dos ateliês parisienses do século XIII e da riqueza da monarquia francesa. Um colírio para os olhos. Sua exuberância arquitetônica é espetacular. Nota-se o esplendor do gótico com os seus detalhes expressos na maior magnitude.

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Foi finalizada em 1248, construída em tempo recorde, cerca de 7 anos e meio, por ordem do Rei Luis IX. Tinha um fim bem específico, o de abrigar as relíquias religiosas compradas do Imperador bizantino Balduíno II. E não eram quaisquer relíquias, era a coroa de espinhos da crucificação de Cristo e um pedaço da Santa Cruz, entre outras, conforme reza, a possível lenda.

O Rei queria transformar Paris na Nova Jerusalém, e trazer peregrinos de todos os lugares para a cidade de Paris. Os movimentos em direção a bela capela realmente tiveram sucesso. O afluxo de peregrinos aumentou consideravelmente. Creio eu, que um dos fatores responsáveis pela canonização do Rei como São Luís em 1297. Entre outros, é obvio.

Outro fator impressionante foi o valor em dinheiro envolvendo a Igreja. Enquanto ela custou 45 mil libras, as relíquias custaram três vezes esse valor, o que foi totalmente exorbitante. Os custos realmente somaram cifras enormes, mas compensadoras pelo requinte e beleza, mas enfim, análises orçamentárias ficam para outra oportunidade. O deleite vem à tona quando nós a fitemos.

A construção, de estilo Gótico Flamboyant, é uma extraordinária obra prima medieval classificada atualmente entre as mais belas expressões da arquitetura ocidental. A obra é dividida em dois níveis: uma capela inferior, que servia os funcionários e serviçais do palácio real e uma capela superior de uso exclusivo do rei e de sua família. A estrutura da Sainte Chapelle é de pedra e surpreende pela extraordinária leveza e elegância obtida por seus engenhosos construtores. A capela superior atinge 15 metros de altura e é cercada por uma grande rosácea e 15 maravilhosos vitrais multicoloridos. Dois terços são originais e um terço foi restaurado juntamente com outros detalhes em meados do século XIX sob a direção do famoso arquiteto Eugène Villet-le-Duc, conhecido restaurador de monumentos nacionais franceses.

Na capela inferior tem-se a sensação de aconchego e acolhimento. Na capela superior as elegantes nervuras de pedra emolduram os vitrais com delicadeza e se elevam até juntar-se na abóbada pintada de azul intenso salpicado de estrelas brancas. Elevação e enlevo são as sensações dominantes nesse espaço mágico banhado pela luz multicolorida que filtra através dos maravilhosos vitrais

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Sainte Chapelle, linda catedral, me proporcionou enormes alegrias, paz, serenidade. Senti-me penitenciado e abençoado dentro desta maravilha gótica. Sinceramente, como historiador, presenciei uma das mais impressionantes sensações de felicidade que um estudioso da História poderia sentir. Obrigado pelo privilégio em conhecê-la.

Este texto é uma homenagem a minha grande amiga Delia Paese, realizadora de um dos meus maiores sonhos, o de conhecer a essência do medievo e tocá-lo literalmente. Obrigado. Salve rainha.

Professor, Historiador, Escritor Paulo Edmundo Vieira Marques

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La Cavalerie – A Comenda de Abastecimento dos Cavaleiros Templários

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Paralelamente às fundações das bastides, outro tipo de aglomeração, a “comenda” foi implantada pelos templários, no século XII. Exemplos bem conservados estão no planalto de Larzac, ao sul da linda cidade de Millau.

Quando chegamos, em uma manhã maravilhosa de sol, eu pude perceber claramente que se tratava de um entreposto de abastecimento. Os templários usavam aquele local para abastecer os seus mantimentos, restaurar os seus armamentos, preservar os seus cavalos, rumo a Terra Santa. Essa linda vila medieval, ricamente preservada, trata-se de uma aglomeração voltada para o cultivo de cereais, a criação de ovelhas e de cavalos para os incansáveis combatentes no Oriente. A presença dos templários durou até 1312, quando a ordem foi extinta por determinação do papa. La Cavalerie continuou sob a gestão da Ordem dos Hospitalários, que herdou os bens dos templários. Ela, sob o comando de poucos cavaleiros, continuou acolhendo peregrinos e templários que deixavam as Cruzadas. Caracteriza-se como uma comunidade hospitaleira, característica daqueles tempos.

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A comenda de La Cavalerie é parte de um conjunto de vilas criadas na região (como: Sainte-Eulalie-de-Cernon, La Couvertoirade) que se dedicavam ao cultivo de cereais e à criação de ovinos e equinos, com o objetivo fundamentalmente de fornecer, aos cruzados alimentos, lã e cavalos.

Me senti muito à vontade na cidade, caminhei por suas ruelas, procurando detalhes em qualquer construção. Tem uma igreja, pequena e rústica, mas de uma beleza indescritível, provavelmente do século XIII. As ruas, até hoje, são recobertas com as pedras do planalto calcário e as habitações eram construídas em dois níveis: no térreo, havia espaços para abrigar os animais e depósitos para a colheita. Uma escadaria externa levava ao andar superior, onde havia os espaços para a habitação.

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A população, na maioria de camponeses, era reduzida, pois os templários não era exatamente o povoamento da região, mas sim a criação de animais e, particularmente, a produção de lã, peles e queijo (o roquefort). Fiz uma explanação em frente a um destes entrepostos característicos da cidade. Me emocionei nesse momento, pois senti que os meus amigos compreenderam a especificidade do local.

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Com a perseguição e extinção dos templários, a bela cidade, ficou sob a administração dos hospitalários que construíram as suas muralhas com as suas torres cilíndricas e imponentes. 

Na despedida da maravilhosa vila medieval, da janela do ônibus, senti um aperto no meu coração. Alguma coisa me dizia que já estive ali e que dei te comer e beber ao meu corcel companheiro de batalhas. Até uma possível volta.

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Professor, Historiador e Escritor Paulo Edmundo Vieira Marques

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Igreja de Saint-Séverin – A Essência do Medievo no Quartier Latin

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Na noite fria de Paris, chuvinha fina, meu coração disparou quando avistei a Igreja de Saint Severin. A Idade Média encravada no Quartier Latin. Pedras maravilhosas repletas de história. Sua fachada me chamava para rezar em seu interior. Feliz e impressionante surpresa ao adentrar em seu portal exuberante. Grato pelo privilégio.

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A Igreja de Saint-Séverin (francês: Église Saint-Séverin) é uma Igreja Católica no bairro latino de Paris, localizada numa rua animada, a rua Rue Saint-Séverin. Pessoas, por um instante, deparam-se com a sua beleza e a admiram respeitosamente. É uma das mais antigas igrejas que permanece em pé na margem esquerda do Sena, e continua em uso como um lugar de oração.

A Igreja é dedicada a Séverin, que era um eremita que lá morava e que orava todos os dias e em todos os momentos do ano, em qualquer estação, em um pequeno Oratório rudimentar. Após a morte do Séverin, uma basílica foi construída no local. Esta foi destruída pelos Vikings e a construção da Igreja atual foi iniciado no século XI, embora suas principais características são o gótico tardio e datam do século XV. Seus recursos externos incluem algumas gárgulas finas e longas mas de uma beleza ímpar e os seus sinos, incluem o mais antigo remanescente em Paris, restaurado, data de 1412; seu toque é recordado num conhecido poema em louvor de Paris de Alan Seeger.

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O interior da Igreja inclui vitrais antigos belíssimos e bem conservados e um conjunto de sete janelas modernas elaboradas e projetadas por Jean René Bazaine, inspirado pelos sete sacramentos da Igreja Católica, em torno do ambulatório da linda construção. Também inclui um pilar incomum em forma de troncos de uma árvore de Palma, peça cativante que pronto a fitemos nos paralisa pela delicadeza artística. A construção do coro em mármore foi possível graças a doações de Ana, Duquesa de Montpensier, prima de Louis XIV. O órgão é assinado Jean Ferrand.

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Até 1790 Saint-Severin foi a sede do arquidiácono sul da diocese da Paris pré-revolucionária. No final do século XIX, o escritor Joris-Karl Huysmans frequentou e popularizou a Igreja. Em 1956 foi palco de uma enorme manifestação de conscritos cristãos contra a guerra na Argélia. Diante de tanta beleza e história, todos os dias, enquanto permaneci em Paris, eu ia rezar em seu interior. O lugar me cativou de tal maneira que quando fui pela última vez pedir pelos meus amigos e família, chorei copiosamente. Minha alegria se misturava com a tristeza em deixar aquele lindo lugar onde me trazia e me relembra a paz.

Saint Severin obrigado por mostrar-me a quietude e o respeito por Deus em pleno Quartier Latin.

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Professor, Escritor e Historiador Paulo Edmundo Vieira Marques

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Besta, Balesta ou Balestra – Mortífera com Qualquer Designação.

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A arma que derrubava cavaleiros, fatal, instigante e intrigante. Uma arma mortífera a ponto de ser proibida pela Igreja de ser usada contra cristãos: essa era a besta, uma arma cujas setas poderiam, em certas condições, perfurar as cotas de malha e as armaduras de placas do soldado medieval.

A besta, balesta ou ainda balestra é uma arma com uma base semelhante a uma espingarda, com um arco acoplado, que dispara setas ou virotes. Como a corda do arco é tensionada e retida em um suporte, a sua potência não depende da capacidade física do atirador, permitindo um disparo mais potente que o de um arco comum.

x4792O arqueiro genovês. Na pintura de Hans Holbein The Elder – o martírio de São Sebastião

É difícil precisar sua origem, já que diversos povos a usaram. O que certas fontes nos indicam é que os chineses já desenvolveram uma arma deste tipo séculos antes da Era Cristã. Ferrolhos de bronze de bestas foram encontrados na China, em sítios arqueológicos que remontam ao século V a. C. e os mais antigos documentos chineses que citam a arma são do século IV ou III a.C. Certamente, o famoso estrategista Sun Tzu conhecia as bestas. Ele atribuiu a invenção a um soldado de nome Q’in do século VII a.C., contudo, as datas da vida de Sun Tzu e de sua primeira publicação da Arte da Guerra, também estão sujeitas a controvérsia, portanto não podem ser usadas para estabelecer as primeiras aparições da arma sem haver dúvidas.

No mundo grego, o historiador Diodorus Siculus (séc. I a.C), descreve a invenção de uma catapulta com um arco (katapeltikon), usada por uma força grega em 2339 a.C. Essa arma seria inspirada em uma besta de mão chamada gastraphetes, uma besta que se apoiava no abdômen do atirador.

x4795Iluminura de autor desconhecido. Besta na defesa de um cerco a um castelo. Entre 1220 e 1250. Fonte: British Library.

Na Idade Média, as bestas se proliferaram, inúmeros combatentes a possuíam. Ainda que um arco possua precisão comparável e taxa de tiro maior que uma besta média, a besta libera muito mais energia cinética, sendo, portanto, mortais contra armaduras, além de poderem ser usadas de forma eficaz após um treinamento de uma semana. Enquanto isso, para alcançar a habilidade no manejo de um arco, era necessários anos de treinamento.

Nos exércitos europeus, besteiros ocupavam uma posição central em formações de batalha. Normalmente, eles atacavam antes do avanço dos cavaleiros. Besteiros também eram importantes em contra-ataques para proteger a infantaria. Junto com armas feitas a partir de equipamentos agrícolas, a besta também era usada por camponeses rebeldes, como se mostrou na revolta dos Tamboritas (séc. XV), uma comunidade religiosa na região da Boêmia, considerada herética pela Igreja Católica.

Cavaleiros montados equipados com lança provaram-se ineficazes contra formações de piqueiros combinados com besteiros, geralmente eram recrutados os genoveses, os mais habilidosos, cujas armas podiam penetrar a armadura da maioria dos cavaleiros. O desenvolvimento de mecanismos para rearmar permitiu o uso de bestas sobre o cavalo, levando ao surgimento de novas táticas de cavalaria.

x4796Batalha de Crécy, Guerra dos Cem anos. Apesar já do uso de armas de fogo em combate, nota-se na ilustração, inúmeros besteiros em combate. Chroniques de Jean Froissart.

Devido à sua letalidade a besta foi proibida pela Igreja Católica de ser usada de cristãos contra cristãos, ficando seu uso liberado contra “infiéis”. O II Concílio de Latrão, em 1139 emitiu a primeira proibição, reforçada por um breve do papa Inocêncio III. Claro que essas ordens eram sumariamente ignoradas nas batalhas europeias. O rei inglês Ricardo Coração de Leão morreu por complicações devido a um ferimento causado pela seta de uma besta, em 1199.

Progressivamente, a besta foi substituída pela arma de fogo, apesar de as primeiras armas terem taxas de recarga mais baixas e menor precisão que as bestas contemporâneas.

 

Professor Paulo Edmundo Vieira Marques

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Sainte-Eulalie-de-Cernon – Comando Templário

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A Comenda de Sainte-Eulalie-de-Cernon, também conhecida como como Sainte-Eulalie Larzac era uma base de comando de guerreiros templários (inicialmente um pequeno mosteiro que pertencia a ordem religiosa e militar da Idade Média), localizada no departamento de Aveyron, no sopé do planalto Larzac 20 km ao sudeste de Millau.

Maravilhosa vila templária. Meu coração foi arrebatado de enorme tranquilidade quando adentrei em suas ruelas repletas de história. Prontamente agradeci a graça e o privilégio de desfrutar daquele momento. O lugar, acolhedor e lindo, exalava paz.

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Um dos interesses da visita a esta região reside precisamente na concentração de vestígios templários importantes, e no fato de o Larzac não ter mudado muito desde esses tempos. É bom começar passeando por Sainte-Eulalie-de-Cernon. Partindo de La Cavalerie, pois as duas cidades completam-se em seus roteiros, desce-se até lá por uma agradável estradinha sinuosa bordejada por buxos enormes e cobertos de folhas. Situada num plano inferior em relação ao planalto propriamente dito, a povoação domina uma parede rochosa que margina o Cernon. Conserva as suas muralhas e inúmeros vestígios. No entanto, o recinto murado, tal como podemos vê-lo hoje em dia, data dos Hospitalários que sucederam, no local, aos Templários. A cidade é de extrema importância no contexto templário na região e posteriormente em um âmbito maior. Sua localização e política guerreira foram um alicerce definitivo na construção da Ordem do Templo.

x4721A Ordem do Templo mudou-se para Sainte-Eulalie-de-Cernon em 1153, quando Raymond, abade de Gelonne (Saint-Guilhem-le-Desert) patrocina generosamente a igreja templária de Sainte-Eulalie através de uma anuidade considerável. Esta primeira doação, significativa, marca o início da instalação dos Templários no planalto Larzac e será seguido por muitos outros a partir de pequenos senhores locais, que são incentivados por generosos patronos como o bispo da região, o conde de Rodez e  o abade de Conques.

Em 1159, Raymond Berenger, conde de Barcelona e rei de Aragão doou todos os seus bens para o Templo da vila de Sainte Eulalie de Larzac. Esta doação também permitiu que os Templários construíssem inúmeras fortificações no entorno da região. Através de trocas, compras, vendas, doações, etc, os Templários conseguiram tornarem-se os principais proprietários das terras de Larzac desenvolvendo um habitat composto principalmente na construção de aldeias de sustentação aos seus objetivos cruzados e plantação de alimentos e pecuária.

x4720Em Sainte-Eulalie-de-Cernon, os Templários objetivaram primeiro fazer o trabalho da expansão da igreja e construir os edifícios da Comenda. A arquitetura da cidade vem na forma de um quadrilátero limitado a leste pela praça da cidade. Originalmente, este quadrilátero foi ladeado por torres quadradas em cada canto, exceto a igreja onde avista-se a excelência da construção maior e central. A parte oriental da Comenda, isto é, que tem vista para a praça, consistiu na construção, incluindo o dormitório e refeitório dos cavaleiros. O piso superior do edifício serviu como casa para o comandante. A parte norte do quadrilátero era ocupado pela igreja e os outros dois lados eram os alojamento dos funcionários e estábulos, celeiros, forjamento, e outros edifícios agrícolas.

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Durante a prisão dos Templários em 1307, o inventário preparado pelos Comissários reais mostra que o comandante tinha material, guardado nestas construções como: cinco bestas, dez capacetes, dois bancos, duas lanças e uma cota de prata. Também possuíam em Sainte-Eulalie-de-Cernon e La Cavalerie 35 cavalos, incluindo burros e mulas e 22 bois. O inventário também continha 120 bovinos, 24 suínos, 180 caprinos e 1.725 ovinos divididos entre as duas cidades.

Como La Couvertoirade e La Cavalarie, os habitantes de Sainte-Eulalie-de-Cernon tinha permissão para levantar as paredes ao redor da cidade para proteger os ataques dos mercenários que cruzavam a região durante a Guerra dos Cem Anos.

A pequena cidade, o Comando Central, ainda hoje, possui dentro de suas construções e na sua bela praça, uma aura encantadora e arrebatadora do medievo. Seguidamente me vejo olhando para o além, com saudades desta inesquecível cidadezinha medieval, sede do primeiro quartel general dos templários.

 

Professor Paulo Edmundo Vieira Marques

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Saint-Antonin-Noble-Val – Os Primórdios do Cristianismo em Aveyron

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Saint-Antonin-Noble-Val (Saint Antonin em occitano) é uma linda cidade medieval na comuna de Tarn-et-Garonne, departamento no Midi-Pyrénées região no sul da França. Um lindo monumento medieval a céu aberto. Encantadora e emocionante experiência.

A cidade tem o nome de Antonino de Pamiers, que trouxe o cristianismo para a região de Rouergue. Ele foi martirizado em 305 D.C., quando a sua tentativa de cristianização não deu certo. Mas a semente fora plantada.  Acredita-se que os seus restos mortais possam estar enterrados em uma abadia da cidade fundada no século IX por Festus, o governante local da Vallis Nobilis. Conta a lenda que Saint Antonin foi o primeiro evangelizador de Rouergue (atual Aveyron), o que influenciou na escolha do nome da cidade

A implantação do cristianismo foi sedimentada e ampliada pelos beneditinos no século XI, e foi concretizada por volta de 1150. No final do século XII passou para o controle dos agostinianos, Cônegos Regulares . Hoje, existem apenas alguns fragmentos que sobreviveram, mas as referências da arquitetura da época permanecem intactas.

As ruelas, são maravilhosas, as esquinas impressionam pela preservação, os prédios conservados nos remetem ao passado. Em cada cantinho encontra-se um café, que por sinal foi um dos melhores que até hoje eu tive oportunidade de degustar.

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Saint-Antonin tem a câmara municipal mais antiga da França. A primeira menção registrada data de 1155, serviu como casa residência nobre dos mandatários da cidade. Em 1212 foi comprado pelos cônsules (vereadores) e foi referida como La Maio del Cossolat. Os cônsules a desocuparam em 1791 e hoje abriga um museu local. Por sinal de inúmeras peças. Interessantíssimo.

O antigo castelo de Vallette (castrum vallatum) foi construído em 1180 por Fortuné de Valletta, filho do visconde Archambauld, que morreu na Terra Santa em 1190. Este castelo está localizado no topo de um penhasco íngreme com vista para o Aveyron, pertinho de St. Antonin, e suas ruínas ainda são visíveis. Também é conhecido como Château de Bône. (A família Vallette deu seu nome à capital de Malta, Valletta, que foi fundada pelo Grão-Mestre da Ordem de Malta, Jean Parisot de la Valette.

O Canal de Bessarel, é de uma beleza ímpar, foi construído no século XIII para atender a um moinho da cidade com a sua fábrica de curtumes, ainda hoje em funcionamento.

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Os senhores de Saint-Antonin adotaram o Catarismo, o que resultou na tomada da cidade por Simon de Montfort, em 1212. Triste passagem da linda vila, com inúmeras pessoas mortas e torturadas. A cidade foi sitiada durante a Guerra dos Cem Anos e duramente castigada pelos ingleses. Durante as Guerras de Religião, o povo da cidade sofreu ainda mais. Tendo adotado a Reforma, a cidade foi pega na luta entre católicos e protestantes e vários monumentos foram tristemente destruídos. Em 1622, durante a rebelião Huguenot , Louis XIII tomou a cidade. Louis XIV, renomeou a cidade para Saint-Antonin-Noble-Val e financiou melhorias importantes. Tornou-se um importante fornecedor de couro e roupas de cama. Em 1681, os protestantes foram excluídos da política e do conselho da cidade, mas a cidade ainda tem um importante templo. Após este período a cidade gradualmente perdeu seus privilégios e sua influência diminuiu. Por um período, após a Revolução Francesa, a cidade foi chamada de Libre-Val, mas logo voltou ao nome Saint-Antonin.  Em 1962, Noble-Val foi acrescentado ao nome da cidade mais uma vez.

Hoje, Saint-Antonin-Noble-Val ainda tem uma estrutura medieval autêntica; as ruas e muitas fachadas do centro da cidade não se alteraram durante 800 anos. Ela apresenta uma série de construções com pedras arqueadas e casas em enxaimel* e passarelas com pórticos intrigantes e espetaculares, ahhh e posso sentir o delicioso cheiro do café serpenteando as ruelas maravilhosas da saborosa, histórica, Saint- Antonin-Noble-Val.

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*O Enxaimel, ou Fachwerk (originário de “Fach” assim denominavam o espaço preenchido com material entrelaçado de uma parede feita de caibros), é uma técnica de construção que consiste em paredes montadas com hastes de madeira encaixadas entre si em posições horizontais, verticais ou inclinadas, cujos espaços são preenchidos geralmente por pedras ou tijolos. Os tirantes de madeira dão estilo e beleza às construções do gênero, produzindo um caráter estético privilegiado. Outras características são a robustez e a grande inclinação dos telhados. Na adaptação do enxaimel às características climáticas da região, foi necessária a implantação, por conta da elevada umidade local, de uma estrutura feita de pedra que sustenta as construções evitando que a madeira se molhe.

Professor e Historiador Paulo Edmundo Vieira Marques

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