Manuscrito Bodleian Library, século XIV, vagão para transporte de armas, soldados e até cadáveres. O vagão de guerra.
Quando, na História, apareceram os transportes como, carretas (veículos de duas rodas) e vagões (veículos de quatro rodas) foram de extrema importância para os homens, para o comércio, para as trocas enfim, com a comunicação com outras pessoas. A sua eficiência com relação aos animais usados sem uma tecnologia de transporte, foi enorme, inexplicável. O historiador Jeffrey L. Singman escreve que uma carroça de quatro rodas com um par de cavalos poderia transportar mais de 1.200 Kg. por cerca de 30 km por dia. Os carros mais antigos, de transportes de homens e mercadorias, usados de forma razoável, foram os trenós usados entre 6.500 e 7.000 a.C. pelas tribos nativas da Europa Central e Oriental.
A ascensão do transporte sobre rodas, em torno de 3000-5000 a.C. teve início em lugares onde existiam fontes suficientes de madeira e aonde a tecnologia do seu corte era existente e avançada no que concerne a sua confecção e moldagem no formato de rodas. Inicialmente, as rodas eram sólidas em vez de raiadas. As rodas eram em forma de peças planas de madeira. As rodas poderiam ser um pedaço sólido de madeira, também poderiam ser encaixadas a partir de duas ou três peças, dependendo do tamanho da árvore original e o tamanho da roda final que se desejasse ao final do trabalho. Apenas ferramentas básicas, como um machado eram necessárias para produzir rodas de certa qualidade e durabilidade. A roda ou o eixo (na forma de toras, colocadas sob um objeto pesado para ajudar a rolá-los) foi a primeira atitude tomada pelo homem para confeccionar um transporte para levar cargas ou pessoas. Ainda hoje isso é objeto de discussão dos pesquisadores. No entanto, a combinação das duas rodas unidas por um eixo se mostrou extremamente eficiente. Os primeiros projetos fixaram os eixos com as rodas, lubrificadas por óleos animais*, que giravam sobre eles, proporcionando menos atrito do transporte sobre o solo.
Manuscrito século XIV, Morgan Library, o carro de bois a direita acima no auxílio à construção de igrejas.
Bandas de ferro, substituição e colocação de revestimentos de couro, introduzidos ao redor das rodas melhorou a longevidade da madeira. O transporte, a locomoção de animais e carroças puxadas por bois eram comuns no Egito, Grécia e Roma. Este meio, também, por muito tempo, foi usado na Idade Média. A grande alteração, no entanto, foi que o prestígio dos carros de bois diminuiu, seriam usados pelos camponeses em longa escala, para todo o tipo de afazeres no campo. Na cidade, nas classes menos favorecidas também foi de grande utilidade. Auxiliando ferreiros, comerciantes monges entre outros. A nobreza medieval e a realeza viraram-se para os cavalos para puxarem os seus carros. Geralmente cavalos de uma raça de grande porte, fortes e robustos para a sustentação de um transporte que requeria muita força. Por muito tempo a maioria da sociedade medieval confiou seu transporte aos bois e eles fizeram um trabalho admirável, dando sustentação para o progresso do comércio da Europa Central. Mas a população acabaria cedendo aos cavalos, aos animais de potência como eram chamados. Sua maleabilidade e rapidez influenciaram enormemente a escolha geral do povo medieval que se locomovia que batalhava levando armamento para as inúmeras guerras e que principalmente comercializava.
O uso de carros e vagões na era medieval, como o historiador John Langdon diz: assumiu um papel importantíssimo na difusão de todo o espectro econômico do mundo medieval. A diferença do transporte fez a diferença para o progresso europeu medieval. Antes do século XII, as carroças, a maioria era puxada de arrasto pesado feito por bois.
Manuscrito do século XIII, Morgan Library, 0 vagão no incremento comercial e das trocas.
Após este período, os cavalos tornaram-se os animais de serviço dominante. O interruptor de potência, no entanto, necessitava uma redução no tamanho e capacidade para a sua flexibilização e manuseio. Carros puxados a cavalo tinham cerca da metade da capacidade daqueles puxados por bois.
No caso de uma carga especial, especialmente pesada, como madeira ou carvão, os bois predominaram no transporte de carros e vagões. Veículos com cavalos e bois tiveram, na sua maior parte, duas rodas. Os vagões medievais, tão lembrados e vistos em filmes e livros, preferencialmente de quatro rodas, eram reservados para o transporte rodoviário, via florestas. Seguidamente assaltados por bandoleiros, ficaram famosos em cenas de filmes. Transportavam de tudo, na maioria das vezes alimentos, mas por ter a possibilidade de se esconder dentro deles, também era a morada preferida de alquimistas e bruxas. Lenda ou não foram muito usados por médicos e curandeiros medievais. Era pau para toda a obra, ou a Kombi daquela época, assim se poderiam resumir os famosos vagões.
Vagão medieval para a utilização de profissões como médicos, comerciantes, alquimistas etc.
O problema do transporte de quatro rodas foi que, apesar de eixos com giro frontal terem sido inventados por volta de 500 A.C., a tecnologia não se expandiu, foi lenta e demorada. Logo no início do período medieval, o giro frontal de eixo não existia, tornando-se quase impossível controlar o animal. O exercício para mantê-lo requeria grande força e destreza. A mudança ocorreu depois de cerca de 800 anos, pelo menos na Europa Central. Sem dúvida, uma demora demasiada para uma mudança tecnológica mais avançada, o que nos leva a conclusões de que as repetidas invasões bárbaras estagnaram melhores inovações nas regiões afetadas pelos choques. Vagões com eixos de giro não seria comum na Inglaterra até o século XVII. Dirigir carros ou vagões medievais foi uma experiência muito instável e dolorosa, era um sacrifício qualquer tipo de viagem, e a maioria delas eram longas naquele período, porque os veículos não tinham suspensão ou qualquer tipo de amortecimento, pelo menos até o século XIV, quando algumas suspensões em vagões de transporte, feitas com molas de ferro foram introduzidas no Flandres, atuais Países Baixos.
Um transporte, um carrinho que pouco se fala e se escreve sobre ele, é o carrinho de mão. Usado especificamente para o transporte de mercadorias como alimentos, ferramentas etc., foi um aliado muito importante para o homem no medievo. O carrinho de mão é de origem medieval e não tem nenhum antecessor romano. Ele, também, foi o único veículo que era empurrado em vez de ser puxado. As iluminuras, as representações e textos de manuscritos datam do século XIII, mas a sua tecnologia, sem dúvida antecede a essas fontes.
* Eram usados para facilitar a locomoção do transporte banha de porco, óleo de peixe, de oliva entre outros e de variações distintas. Conta-se na Idade Média, século XI, em Bruges até mel se usava para tal fim. Nas Cruzadas o óleo preferencial para o transporte das tropas era o de javali, por ser espesso, mas de excelente viscosidade e penetração nos eixos e extremamente duradouro.
Réplica de um vagão medieval para transporte de doentes e feridos.
Professor, Historiador: Paulo Edmundo Vieira Marques
Carcassonne é a mais bem preservada cidadela medieval de toda a Europa. Construída no alto de uma colina, no sul da França, perto de Toulouse e dos Pirenéus, foi no passado a principal fortaleza militar da região. Do alto das suas impressionantes muralhas, que eram protegidas por mais de 1200 guerreiros, podia-se controlar uma importante via comercial que ligava a Península Ibérica com o resto do continente. Por causa de sua posição fronteiriça e estratégica, Carcassonne foi palco das mais ferozes e terríveis batalhas desse tempo. A primeira visão do centro histórico, cuja construção foi iniciada há cerca de mil anos, é inesquecível.
A impressão que dá é que viajamos no tempo, para uma época de reis, cavaleiros, princesas e batalhas medievais. A fortaleza é protegida por 52 torres e duas muralhas uma interna e outra externa. A entrada principal, batizada de Porta Narbonnaise, é guardada por uma ponte levadiça. Na Era Medieval, cerca de 50 homens ficavam de guarda para impedir a entrada dos inimigos. Carcassonne, na verdade, são duas cidades. A Cidadela, que permaneceu intacta e protegida dentro das muralhas, e a Bastide Saint-Louis ou Cidade Baixa, que cresceu ao redor da fortaleza medieval. À noite, esta cidade transforma-se. Com menos de 400 moradores e apenas dois hotéis, as suas ruas ficam desertas e silenciosas, é a melhor hora para sentir o pulsar das muralhas, das ruas e também viajar, recuar 800 anos para sentir a vida de uma população que de uma forma melhor ou pior, viveu sem dúvida de uma maneira bem diferente da nossa. Uma das maiores atrações da cidade, é o Castelo Comtal, uma pérola da arquitetura medieval. Construído no século XII por um nobre chamado Bernard Trencavel, esta foi, durante anos, a morada dos senhores feudais que comandavam a região.
O castelo é formado por duas alas, com um pátio no meio delas. Durante uma visita guiada, é possível conhecer as suas torres e boa parte do seu interior mais reservado. O Museu Arqueológico, tem no seu acervo ânforas romanas, sarcófagos e lápides Cátaras. (Os Cátaros faziam parte de uma corrente do cristianismo que pregava a não-violência e foram muito perseguidos pela Inquisição e dizimados pelo Papa Inocêncio III, com o auxílio do rei da França e os barões do norte). Para entender um pouco mais da história do lugar, vale a pena conhecer também o Museu da Inquisição, que expõe instrumentos de arrepiar. Esse triste período da história ocidental teve início no século XII e ganhou força quando o papa Inocêncio III autorizou o uso da tortura para obter a confissão dos heréticos. Verdadeiras atrocidades eram cometidas em nome da fé e, neste museu, podem ser vistos vários instrumentos como a cadeira de cravos, uma espécie de trono cheio de pregos onde o acusado era amarrado com cintos de ferro; e o berço de Judas, um triângulo de madeira com uma base de 30 centímetros e vértice de 60 usado para martirizar os hereges. Carcassonne é também um importante centro culinário. A cidade está cheia de bares, cafés e charmosos restaurantes, que lembram antigas tabernas medievais e tem o seu centro gastronómico no centro da praça. Escolha uma mesa ao ar livre, no meu caso a chuva era muito forte e tive que degustar no interior de um restaurante, por sinal a comida de ótima qualidade. Experimente um (cassoulet,) o mais famoso prato da região. Para acompanhar, saboreie um dos bons vinhos do lugar, como Corbieres, Minervois e Malepère. Uma refeição digna de reis e rainhas medievais.
A sensação que se tem em Carcassonne é a de um castelo encantado, repleto de histórias e contos fantásticos. Uma vez dentro das muralhas, descobre-se uma verdadeira relíquia da Idade Média, justamente procurada por milhões de turistas todos os anos. Hoje, Carcassonne é, depois da Torre Eiffel e do Monte Saint-Michel, o local mais visitado de França. As suas calçadas de pedra são percorridas, não por cavaleiros medievais, apesar de sentir-me como tal, mas por turistas de todas as nacionalidades, armados de vídeos, celulares, ipads e máquinas fotográficas
A Basílica de Saint-Nazaire, a igreja original começou a ser construída no século 6, durante o reinado de Teodorico o Grande, o governante dos visigodos. Em 12 de junho, em 1096, o Papa Urbano II visitou a cidade e abençoou as pedras usadas para construir a catedral de Saint Nazaire e São Celse; a construção foi concluída na primeira metade do século XII. Foi construída no local de uma antiga igreja carolíngia, dos quais não se encontraram vestígios, mas pesquisas permanecem no local pois crê-se da existência dos mesmos. A cripta também, apesar de sua aparência antiga, remonta a nova construção. A igreja foi ampliada entre 1269 e 1330 no estilo gótico, em grande parte, à custa do bispo de Carcassonne, Pierre de Rochefort. Construída no intuito de intensificar a fé católica na região, até hoje, atrai peregrinos e visitantes de todos os credos para o seu recinto escuro, que convida ao recolhimento, iluminada por magníficos vitrais. O encontro do românico com o gótico dá-se aqui de uma forma harmoniosa, justificando o nome de: (joia da fortaleza,) com que os folhetos turísticos a distinguem. O seu órgão é um dos mais importantes e antigos do sul de França, e de Junho a Setembro há concertos diários. Pelas suas praças, onde ainda resistem alguns poços de pedra que abasteciam de água a população, distribuem-se agora esplanadas muito concorridas, com espetáculos diários de música ao vivo, bem distinta da dos trovadores Ramon de Miraval ou Peire Vidal, que aqui viveram durante algum tempo. Raymond-Roger Trencavel, visconde de Albi e último senhor da fortaleza, certamente não reconheceria a sua cidade. É certo que qualquer loja de souvenires vende conjuntos de capacete e espada, e mesmo armaduras completas. Também é fácil encontrar relógios de sol e saquinhos de pano com ervas cheirosas, das que perfumavam as roupas das damas da época. Mas a animação é sempre pacífica, e a magnífica iluminação noturna não dá paz aos fantasmas, impedindo o seu devaneio noturno e doloroso quais almas penadas; de acordo com o relato dos moradores e agentes turísticos durante os meses do verão, estive lá na primavera, Carcassonne é uma cidade profusamente habitada e muito viva. Para reconstituir ainda melhor o ambiente medieval, em agosto organizam-se torneios de cavalaria e falcoaria, com participantes vestidos a rigor, como no tempo dos cruzados. As velhas pedras da cidade não devem apreciar particularmente a lembrança, uma vez que foram estes que, em 1209, ditaram o seu fim: o visconde de Trencavel teve a ousadia de oferecer abrigo e proteção aos Cátaros, dissidentes de um catolicismo que se afundava na decadência moral. O seu pecado era defenderem a pureza dos costumes cristãos e não respeitarem a hierarquia eclesiástica.
Basílica de Sainte Nazaire, Carcassonne.
Carcassonne foi das primeiras cidades a sofrer o embate da guerra santa declarada pelo Papa Inocêncio III. Cercada, perdeu o acesso crucial ao rio Aude e, numa manobra pouco “cavaleiresca”, o visconde de Trencavel foi feito prisioneiro ao sair do castelo para negociar. A partir daí, começou o declínio. Simão de Montfort, o comandante da cruzada, administrou a cidade até à sua morte, mas o seu filho foi incapaz de manter o território conquistado, e entregou-o à autoridade direta do rei. Quando o filho do visconde de Trencavel tentou reaver as terras do pai, Luís VIII deu ordens para arrasar a fortaleza e exilar os seus habitantes; só sete anos mais tarde conseguiram obter autorização real para se instalarem de novo na zona, mas do outro lado do rio. O turismo anuncia Carcassonne como ( lá ville aux deux cités, a cidade das duas cidadelas) a antiga fortaleza, no cimo da colina, e o novo burgo que nasceu no século XIII, aos pés da primeira, na margem esquerda do rio Aude. Desde sempre as duas zonas tiveram existências distintas, com toda a atividade comercial e social a desenrolar-se em baixo, enquanto a cidade-alta abrigava uma guarnição de mais de mil soldados. A tendência manteve-se até hoje. Só cerca de duzentos e vinte, dos seus quarenta e cinco mil habitantes permanentes, habitam a cidade antiga. Mas apesar da atividade evidente nas suas ruas e praças arborizadas, que substituíram as muralhas e estão agora semeadas de cafés acolhedores, mas é óbvio, a atração será sempre a “cité”, marco milenar da história da região do Languedoc.
Para além das comodidades e serviços turísticos de que dispõe, a Bastide Saint-Louis, como é conhecida a cidade-baixa, serve apenas para compor a magnífica vista que nos oferecem as torres altas da fortaleza – e do cimo desta sentinela de pedra, não se consegue evitar a sensação de fragilidade que vem do casario baixo e pálido da Bastide. Nada é regular ou simétrico nesta obra-prima da arquitetura militar, o que se explica pela longa história de reconstruções, modificações e acréscimos, que já dura há séculos e ainda não acabou. Mesmo depois da expulsão dos seus habitantes, a fortaleza foi modificada e aperfeiçoada, de modo a tornar-se um eficaz posto militar avançado. Ao mesmo tempo que se reforçou o sistema defensivo com a construção de uma segunda muralha exterior, também a austera Catedral de Saint-Nazaire foi aumentada e melhorada. O castelo do conde foi rodeado por um fosso, transformando-se numa fortaleza dentro da fortaleza. São cerca de três quilómetros de fortificações, por onde se distribuem cinquenta e duas torres para todos os gostos: há torres quadradas e redondas, de envergadura e tamanho diferentes; umas têm seteiras, outras janelas e algumas são, aparentemente, fechadas. Toda a cidade parece estar cheia de armadilhas: cotovelos estreitos para que só passe um inimigo de cada vez, degraus gigantescos, fossos dissimulados, enfim, todo o mostruário do engenho militar que foi sendo aperfeiçoado desde os romanos, destinado a guerras de cerco, tão comuns nos tempos medievais. Só a mudança das técnicas de guerra, nomeadamente a utilização generalizada da artilharia e a pólvora, nos séculos XV e XVI, a tornou definitivamente obsoleta
Apesar de tudo, é impressionante o seu aspecto exterior de castelo, ao mesmo tempo irreal e inexpugnável. Contorná-la por entre as suas duas muralhas, espreitando pelas janelas e varandas para a paisagem verde de vinhas e campos cultivados, é um convite para uma viagem no tempo, que continua quando atravessamos a ponte levadiça. As ruas estreitas de pedra cinzenta, sombrias no verão e primavera e protegidas dos ventos frios no Inverno, transformam-se num labirinto, e nunca sabemos se terminam nas muralhas, na basílica ou na praça principal. Pouco importa. Os passos ecoam de longe, e a cada esquina esperamos ver aparecer alguém vestido de cota de malha e elmo reluzente. As carroças que conduzem os turistas em visitas guiadas reforçam a esperança, com o ruído dos cascos e o soprar dos cavalos a ressoarem nas paredes de pedra. Para continuar o recuo no tempo, é possível visitar o castelo do visconde, que dá acesso exclusivo a certas partes da muralha. E para terminar a viagem, nada melhor que uma visita ao Museu Medieval e ao da Inquisição, que nos proporcionam pormenores nem sempre agradáveis da história da cidade. Outro museu ao gosto da época é o da Tortura, que exibe sádicos e requintados instrumentos, concebidos em noites de insônia, destinados a punir sabe-se lá que crimes medievais.
Dizem os seus apreciadores mais sinceros que a cidade não deve ser visitada no Verão: há demasiada agitação e pouca privacidade para percorrer a velha Carcassonne, e a viagem no tempo, que deve ser feita na solidão, é constantemente interrompida por grupos de turistas ruidosos.
O destino de Carcassonne está traçado: será para sempre uma obra de arte inegável, e uma das maiores atrações turísticas da França e da Europa. A reconstrução fixou-a para sempre na Idade Média como quem tira uma fotografia, apesar de a cidade ter atravessado muitas outras épocas. E é, talvez, esta operação de congelamento temporal que lhe empresta toda a magia de cenário perfeito, que nos faz mergulhar profundamente num passado distante, belo mágico e por vezes também aterrador.
A Lenda da dama de Carcas
Não há castelo encantado que se preze que não tenha as suas lendas. Carcassonne justifica o seu nome com a história da dama de Carcas: quando Carlos Magno cercou a cidadela desta dama sarracena, achando-se desprovida de soldados, Carcas distribuiu pelas torres e muralhas bonecos feitos de palha, armados para combate. O estratagema teve resultado, e Carlos Magno levantou o cerco, desanimado com inimigo tão numeroso. Terá dito então a dama: “Sire, Carcas te sonne.” (“Senhor, Carcas vence-te”, em tradução livre). Daí o nome da cidade, que a lenda assegura ter-se tornado cristã, dando a dama origem à primeira linhagem de condes de Carcassonne. Outras lendas a respeito do nome da cidadela também são descritas, mas fiquemos com as menos extravagantes. A verdade, porém, é que os romanos já tinham uma fortificação na zona a que chamavam Carcasso, e os sarracenos, que se sucederam aos visigodos e não ficaram por aqui muito tempo, chamavam-lhe Carchachouna. A cidade-fortaleza foi palco de combates, cercos, destruições maciças e, por fim, expulsão dos seus habitantes, que resultou na ruína do que ainda estava de pé.
Dame Carcas. Porta Narbonnaise, Carcassonne.
Lendária mesmo parece ser a sua reconstrução no século XIX, pelo arquiteto Viollet-le-Duc, o mesmo que restaurou os santuários de Notre-Dame de Paris e Sainte-Madeleine de Vézelay. Homem de sensibilidade e força de vontade que nos proporciona, até hoje, vivermos momentos inesquecíveis a respeito da Era dos Anjos, a Era do Medievo Bonito e intrigante. Ahh cidade deslumbrante, cidade que me remeteu ao passado, que fez chorar, sorrir, enfim cidade maravilhosa, por favor guarda os meus passos que deixei pelas pedras de tua cidade la. Até a volta.
A bela Carcassonne, saudades.
Este artigo foi feito em homenagem a minha amiga Delia Paese, grande admiradora de La Cité, Carcassonne. Grande Abraço.
Muito obrigado pelas manifestações de carinho e apreço endereçadas a mim nesse Dia do Professor, as repasso aos meus abnegados colegas de profissão
Abe Deo Vincit Semper Gladius Auxilius Nobis
Thank you very much for the expressions of affection and appreciation addressed to me in this Teacher’s Day, I pass them on to my selfless colleagues in the profession
Toda a história da Idade Média, a minha história medieval, sem especificação de datas de seu início ou fim, está exposta nas suas ilustrações, nas suas iluminuras. Observe atentamente aos detalhes fornecidos pelos traços dos pintores, iluminadores, escribas medievais. Ansiosos, ousados e talentosos, eles nos deixaram um legado para que buscássemos entender, nas suas obras, o que viria pela frente, no futuro. O passado estava contado, mas também nos deixaram muitas perguntas ainda a serem pesquisadas e decifradas. É preciso que busquemos essas respostas para não os decepcionar. Só se faz isso através da paixão, da capacitação e da observação. Precisamos, em outras palavras, resumindo, de sensibilidade. Poucos a possuem e os que têm o privilégio de usufruí-la necessitam exercitá-la. Idade das Trevas, que nada, incitante e intrigante período. Idade da perspicácia. De dificuldades, talvez, mas todos os períodos históricos tiveram e nunca deixarão de ter. A singularidade está nas mensagens. As imagens medievais nos disseram como foi no passado e como deveremos agir no futuro. Como proceder? Somente observe os manuscritos, as iluminuras, os livros das horas, as pinturas e deixe seu imaginário funcionar. Benditos segredos e incógnitas que deixam o presente inquieto para decifrar o medievo. Pois, “a pessoa é a última solidão do ser”.
Iluminura século XIV, início do século XV, aproximadamente. Fonte: British Library.
Idade Média, época das aventuras, das trilhas das pedras, da História, do tempo mutante, das transformações. O belo renasce, o olhar é perspicaz. O homem se descobre, o mundo é novo.
Uma indagação se impõe com referência à escolha do contexto temporal e temático deste estudo e pesquisa de imagens e artigos para a internet, que é a seguinte: Qual o sentido em estudar o Ocidente medieval, uma sociedade tão longínqua no tempo e no espaço, a partir das terras americanas e, em particular, brasileiras? Argumenta-se que: como já se viu, nas pesquisas e estudos de vários historiadores renomados, a Baixa Idade Média, continuou caracterizada pelas estruturas fundamentais de dois séculos anteriores. Encontraram-se nela os mesmos grupos dominantes principais e os mesmos grupos dominados; a Igreja continuou sendo a instituição hegemônica, enquanto prosseguiu o desenvolvimento do mundo urbano e o reforço dos poderes monárquicos. A conquista e colonização da América não é o resultado de um mundo novo, nascido de uma decomposição e agonia da Idade Média. Muito além das transformações, das crises e dos obstáculos, é a sociedade feudal, prosseguindo a trajetória observada desde o início do segundo milênio, que empurra a Europa para o mar. É uma Europa ainda dominada por longo tempo pela lógica feudal, com seus protagonistas principais, a Igreja, a monarquia e a aristocracia (mercadores), a riqueza crescente dos burgueses, que finca o pé na América, e não uma Europa saída transfigurada da crise do fim da Idade Média e agora portadora das luzes do Renascimento e Humanismo. A América foi conquistada, não creditando aos seus autores a mentalidade americana, mas provavelmente aos seus valores e a lógica de seus comportamentos provenientes de um contexto medieval. Diante disto, complementando e ratificando a importância dos estudos medievais a partir de um olhar sul americano e brasileiro.
Medievo maravilhoso. Medievo fantástico. A Idade dos Anjos sempre nos deixará a sensação que já vivemos nesta época. Porque nos instiga, nos atrai de uma maneira cativante. Porque ela se fez através de dificuldades extremas, mas mesmo tempo diante das adversidades mostrou-nos o belo, o talento, a compreensão de que somos seres dotados de sensibilidade o suficiente para construir coisas lindas e maravilhosas para desabrochar a alegria e sentimentos de compreensão e justiça. Salve Idade Média cativante.
Autor: Paulo Edmundo Vieira Marques, historiador, professor, escritor medievalista.
Ave Maria gratia plena Dominus tecum; Benedicta tu in mulieribus, et benedictus fructus ventris tui, Iesus.Sancta Maria, Mater Dei, ora pro nobis peccatoribus, nunc et in hora mortis nostrae.Amen.
Saí de Paris às 8:34, pressentindo que algo de maravilhoso me aguardava, a fé e a paz. A estação ferroviária, de onde o trem inicia o trajeto, por sinal muito bonito, para Chartres, é a Gare Montparnasse, não me sai da minha mente aquele caminho. É possível distinguir suas torres desiguais que representam o Sol e a Lua bem antes de chegar ao pequeno vilarejo de Chartres, a 170 quilômetros de Paris. Erguida numa região quase plana, a Catedral levanta-se como uma montanha feita de pedra cinza que pode ser vista da janela do trem.
Quando falamos sobre Chartres, estamos na realidade falando da Catedral de Chartres. Belíssimo edifício gótico do século XIII, ponto de partida para a peregrinação até Santiago de Compostela. A catedral se encontra ao lado da estação ferroviária de Chartres. Um pequeno aclive de ruas medievais nos leva ao seu encontro. No trajeto, diante de um frio intenso, chuva fina e frio, quase neve, meu coração pressentia que alguém me chamava. Induzia-me para a fé e a paz.
Chartres é uma das primeiras catedrais da França. No final do século XII, graças ao apoio da burguesia e da classe trabalhadora, os reis conseguiram retomar a sua autoridade. Enfraquecido o poder feudal vai aos poucos desaparecendo. A população passa a ter maior influência na vida pública, da qual tinha sido até então uma mera espectadora. Eufóricos diante da própria importância, os habitantes de cada região sentem a necessidade de demonstrar sua emancipação. A Catedral será o símbolo da sua vitória. Aí se realizarão não apenas os atos religiosos, mas as atividades comunitárias de todo o grupo, será a casa do povo. Não mais cheia de esculturas e desenhos tenebrosos, mas alta, imponente, iluminada. Que as suas torres pontiagudas tentem atingir as nuvens. Livre do fim do mundo, o povo é animado por um novo sopro de fé. As paredes de seu templo devem deixar entrar a luz do sol em múltiplas cores que lembrem a presença divina. Da necessidade de construir catedrais que correspondessem à euforia e ao misticismo do povo surgiu a arquitetura gótica. As primeiras foram construídas na França, ao redor de onde se encontra a cidade de Paris, uma das primeiras regiões da Europa a erradicar o feudalismo.
A catedral atual foi construída entre os anos de 1194 a 1250. Ela é a última versão das quatro igrejas anteriores que existiam ali e que foram destruídas em incêndios devastadores. Chartres foi erguida sobre a penúltima igreja, que era em estilo românico e que hoje é mais conhecida como igreja baixa ou cripta. Tanto a construção românica que serve de alicerce como a própria catedral foram construídas dentro das proporções harmônicas da geometria sagrada e dos números pitagóricos, uma herança vinda dos antigos gregos que foi reabilitada no século XI com Chartres. A geometria sagrada de Pitágoras era baseada na música, e não na arquitetura. Por isso é possível dizer que Chartres é uma composição musical feita em pedra e vidro por autores desconhecidos que sabiam como provocar a ressonância harmônica entre as forças sutis e o ser humano por meio do uso consciente da geometria.
Quando foi reinaugurada em 1250, Chartres imediatamente chamou atenção de toda a Europa. A construção era o que de mais moderno existia em matéria de arquitetura e uma absoluta novidade para a época. Era a segunda igreja do continente a ser construída no estilo gótico (a primeira foi a pequena St. Denis, em Paris). Durante a Idade Média, milhares de peregrinos chegavam ao pequeno vilarejo para visitar a catedral em busca de conforto espiritual, mas também de cura do corpo físico, pois a Chartres tinha a fama de operar milagres. Ao contrário de hoje, eles não entravam pela porta principal do lado oeste, mas iniciavam o caminho penetrando na cripta, alguns metros abaixo do piso da catedral, onde estão erguidas as paredes da igreja românica original. E os viajantes ficavam ali por horas ou dias até se sentirem prontos e purificados para adentrar na igreja, como num processo iniciativo de expurgação e cura dos seus sofrimentos. Era como um homem novo que o peregrino entrava na catedral pela primeira vez, pronto para um contato com um plano espiritual anteriormente inatingível.
É justamente na cripta que se esconde o primeiro grande mistério de Chartres, as correntes telúricas (energias terrestres) sobre as quais a catedral teria sido fundada. Meu coração quando visitou a cripta de Chartres disparou, como se me purificando.
Alguns autores apontam Chartres como uma colina já considerada sagrada pelos celtas, povo que habitava o lugar bem antes da época cristã. Situada numa confluência de veios subterrâneos de água organizados artificialmente sob a forma de um leque aberto, a catedral se assenta sobre um mound, palavra céltica que designa uma colina onde se concentram forças telúricas de grande potência, chamadas por eles dewouivre (ou vril). “O mound sobre o qual a catedral de Chartres está construída era um local sagrado muito antes do cristianismo”, diz Tim Wallace Murphy, autor do livro O Código Secreto das Catedrais. “Ele era sagrado muito antes que os druidas lá chegassem, e já era um centro de peregrinação na época, e desde então”, afirma. Como os “vapores” que emergiam de templo de Delfos, na Grécia, e que colocavam as pitonisas num diferente estado de consciência, acreditava-se que as correntes de wouivre do mound de Chartres atuavam no ser humano como centelha inicial de um processo transformador de consciência.
De acordo com alguns especialistas do assunto, o lugar já deveria ser conhecido como uma espécie de Stonehenge desde o Neolitico. Os canais subterrâneos de água foram construídos de forma a intensificar conscientemente a energia natural que brotava da terra. “Esses são lugares onde essa força telúrica extremamente poderosa, ou Spiritus Mundi, pode ser detectada. O Spiritus Mundi é tão potente que é capaz de despertar o homem para a vida espiritual.
A cripta é dividida entre muitas capelas e altares. Escura, essa igreja parcialmente subterrânea recebe a pouca luz que vem de fora através de minúsculas janelas. Hoje a cripta é iluminada artificialmente, mas não com muita luz, para preservar um sentido de introspecção e recolhimento. É sombria e, para alguns, assustadora. Uma das duas jornalistas que está comigo nessa visita começa a passar mal e se apóia no meu braço. A guia fala muito rapidamente, numa sucessão de dados históricos e culturais. Sua voz começa a não ter mais sentido para mim. Quando nós nos dirigimos ao poço que fica no meio da cripta, eu percebi que minha mente estava quase vazia de pensamentos. Embora a água dos veios do poço tenha sido desviada há séculos e ele seja basicamente um poço comum muito profundo, mesmo assim a energia se manifesta intensamente. Não é raro o visitante sentir-se mal por causa da atuação poderosa da wouivre telúrica ainda presente. Segundo alguns e, eu senti pessoalmente as correntes telúricas são muito fortes lá embaixo. Aquele é um dos pontos magnéticos mais fortes da Terra. Ele faz parte da cura que as pessoas buscavam na Idade Média. As correntes intensas transmitem a sensação de se estar sendo puxado para baixo.
Possivelmente a cripta atuava como purgatório, onde o peregrino se livrava de suas dores, males e sofrimentos. Eles eram, literalmente, sugados para baixo pela terra.
Na cripta, além de rezar para a imagem da Virgem Negra, como era conhecida nos tempos medievais (uma antiga cópia substitui atualmente a original, queimada num incêndio durante a Revolução Francesa), os peregrinos bebiam a água do poço subterrâneo, considerada milagrosa. Isso quer dizer que, além da purificação do espírito, eles passavam pela cura do corpo, e sua consequente mudança de paradigma energético por meio da ingestão da água dos canais subterrâneos. Ali, rezavam várias missas por dia, na penumbra e sob as graças de Notre Dame-sous-terre (Our Lady of Underworld).
As Madonas Negras, como a de Notre-Dame-sous-terre, são veneradas em muitas igrejas da Europa. A origem desse culto é antiquíssima.
A tradição da veneração da Madona Negra em grutas e criptas é aceita como um culto pré-cristão. Era muito popular entre os druidas (os sacerdotes celtas) que habitavam parte da Gália, onde atualmente existe a França. Para eles, a Virgem Escura representava a força da natureza escondida sob a terra durante o inverno, que posteriormente explodiria em flores e frutas durante a primavera-verão. A Madona Negra também materializava a profecia celta que dizia que uma Virgem Sagrada e seu Divino Filho, o Salvador do Mundo, seriam muito importantes no futuro.
Mais de 500 esculturas de Madonas Negras foram descobertas na Europa, geralmente escondidas em grutas e cavernas. A imagem de Chartres, por exemplo, é muito parecida com a da igreja de Rocamadour, mais ao Sul da França e a de Nossa Senhora de Montserrat, na Espanha. Notre Dame-sous-terre também era conhecida dos romanos antes de Cristo e foi descrita pelo imperador Júlio Cesar como a Virgini Pariturae, ou a Virgem prestes a dar à luz, cerca de 50 anos antes do nascimento de Jesus. Nessa época, ela era adorada pelos druidas no lugar sagrado de Carnutum, entre os rios Eure e Loire, exatamente na colina onde hoje está erigida Chartres.
Provavelmente de origem egípcia – Ísis também era conhecida como Virgem Negra, e mãe de Hórus, o Sol – a tradição celta desse culto se espalhou pelo solo gaulês e seus altares antecedem inúmeras igrejas católicas atuais hoje dedicadas a Nossa Senhora. Imagens famosas de Madonas Negras conhecidas como Notre Dame-sous-terre se acham presentes na França, Itália, Espanha, Alemanha e Polônia.
Os cavaleiros templários, muito ligados à história da construção de Chartres, também abraçaram a veneração a Virgem Negra, mas por outros motivos. De acordo com alguns autores, a Madona Negra também representava a senhora que está oculta, ou Maria Madalena, protetora deles. Nesse oceano de especulações e teorias, é bem possível que esse sincretismo realmente tenha ocorrido em Chartres nos tempos iniciais da cristianização da Gália. Mas se associação da imagem com Maria Madalena é incerta, com certeza há um vínculo estreito entra a catedral e a Ordem dos Templários. Na cripta, vários vitrais em pequenas janelas ainda ostentam a cruz templária e Bernard de Clairvaux, um dos inspiradores da Ordem, foi um dos grandes incentivadores da construção da catedral.
Portanto, disfarçados sob a aparência de uma intensa devoção à Nossa Senhora, mãe de Jesus, existe a possibilidade de que vários cultos e crenças fossem misturados sob o olhar muitas vezes complacente da Igreja. Mas nem sempre essa convivência foi pacífica. Os padres se tornavam cada vez mais incomodados e resistentes com os cultos de origem pagã praticados dentro dos muros das catedrais. Mas aos poucos, a devoção à Madona Negra transformou-se na devoção à Nossa Senhora, mãe de Jesus, e continuou intensa por séculos e séculos.
Outra imagem de Madona Negra famosa na catedral de Chartres é a de Notre Dame-du-Pilier. Ela foi colocada em cima de uma coluna dentro da igreja para substituir a imagem destruída num incêndio dentro da cripta (a imagem que existe hoje é uma antiga cópia dela). Na verdade, a imagem policromada de Notre-Dame-du-Pilier era originalmente branca (era conhecida como Notre Dame-la-Blanche) e talvez ela tenha sido colocada dentro da parte de cima da catedral para enfraquecer o culto à Madona Negra que se realizava abaixo na cripta. Mas, por ironia, com a passagem do tempo Notre Dame-la-Blanche também se tornou… negra, porque foi escurecida pela fumaça das velas dos fiéis. E assim eles continuaram a devoção a Madona Negra na figura dela.
A imagem de Notre-Dame-sous-Pilier em Chartres foi colocada em cima de uma coluna, num lugar de muita energia e devoção. Considerada uma Virgem Negra por séculos, ela recebeu recentemente uma pátina branca que devolveu a cor original à imagem.
Como outras virgens escuras, inclusive Nossa Senhora da Conceição Aparecida (que é a santa padroeira do Brasil), Notre Dame-sous-Pilier recebeu uma vestimenta feita de tecido, que deu à imagem uma aparência piramidal em forma de sino. Assim ela é descrita pelo autor de O Código Secreto das Catedrais. ”A Virgem foi vestida de acordo com a tradição, com mantos pesados e ornamentados, formalmente modelados como um triângulo. Se ficarmos em frente do pilar onde ela está, é possível se detectar um nível tangível de energia, um lugar de poder dado por Deus onde a vibração é tão baixa que pode induzir uma sensação de desfalecimento, indicando que esse também é um ponto de transformação espiritual”
Mas depois de uma reforma recente da catedral, em 2012, a imagem de Notre-Dame-du-Pilier recebeu novamente a pátina branca original, e os vestidos vaporosos dela foram retirados. Atualmente, elamais parece uma boneca colorida, mas o ponto energético diante dela provavelmente continua a atuar como antes. Mas de acordo com contatos com peregrinos eles não gostaram nem um pouco das mudanças na santa.
Mais tarde, eu entrei no espaço reconfortante da catedral com o coração leve, como os antigos peregrinos. Eu dei um suspiro de alívio. Meus olhos se acostumaram aos poucos com esse outro tipo de penumbra, agora repleta de cores luminosas, os vitrais me encantavam, e energias celestes, como afirma a tradição de Chartres. A catedral é escura para que os vitrais dela se tornem mais nítidos, um espetáculo para os olhos e para o coração. Naquele momento, o templo parecia um grande útero iluminado por joias cintilantes. Chegava agora o momento certo de encontrar o labirinto.
De acordo com alguns livros e autores, o labirinto é uma viagem rumo ao centro do ser feita exteriormente e interiormente. O constante andar em círculos faz rapidamente o cérebro perder referências de tempo e espaço. Em poucos minutos, é possível se caminhar em outra dimensão temporal e espacial nas voltas do círculo. E ao tentar encontrar a rota certa com muita concentração, podem surgir muitos insights paralelos sobre nossa vida.
O nosso percurso fatalmente chegará ao centro. Nesse ponto, segundo medidas feitas por especialistas em radiestesia, está presente um alto nível de vibração energética, que pode fazer o corpo oscilar levemente para frente e para trás. É no centro do labirinto que, em prumo, nos tornamos um elo perfeito e o céu e a Terra. “Tanto no labirinto de Creta quanto no de Chartres, só um caminho conduz ao centro. Reencontrei alguns caminhos perdidos, a fé de Chartres me conduziu a uma enorme paz, que durante anos a tinha perdido. Por alguns momentos percebi que é possível encontrá-la desde que você realmente a deseje.
Andei na direção do centro do labirinto. E fiquei ali, silencioso, por uns quinze minutos. Realmente senti um influxo de energia que vinha de cima, e me banhei nessa força iluminadora por algum tempo, inerte, mas muito feliz. Depois, eu agradeci interiormente e me dirigi ao altar. Rezei silenciosamente e agradeci comovido “Abe Deo Vincit Semper Gladius Auxilius Nobis” Fiz, com todo o meu coração, senti-me peregrino possuído com a luminosidade de Chartres para voltar ao mundo e irradiar a luz da bela Catedral.
Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador, Escritor Medievalista.
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Autor: Paulo Edmundo Vieira Marques, historiador, escritor medievalista, professor.
A arte românica refere-se à arte da Europa desde o final do século X até a ascensão do estilo gótico no século XIII ou mais tarde, dependendo da região. O termo “românico” foi estipulado pelos historiadores da arte do século XX para se referir especificamente à arquitetura do período de tempo, que manteve muitas características básicas do estilo arquitetônico romano – principalmente arcos semicirculares – mas manteve características regionais distintas. No sul da França, Espanha e Itália, houve continuidade arquitetônica com o período da Antiguidade Tardia, mas o estilo românico foi o primeiro estilo a se espalhar por toda a Europa católica e, portanto, o primeiro estilo pan-europeu desde a arquitetura romana imperial. A arte românica também foi influenciada pela arte bizantina, especialmente na pintura, e pela energia anticlássica da decoração da arte insular das Ilhas Britânicas. A partir desses elementos foi forjado um estilo altamente inovador e coerente.
Arquitetura
Combinando características de edifícios romanos e bizantinos, juntamente com outras tradições locais, a arquitetura românica distingue-se pela qualidade maciça, paredes grossas, arcos redondos, pilares robustos, abóbadas de arestas, grandes torres e arcadas decorativas. Cada edifício tem formas claramente definidas e um plano simétrico, resultando em uma aparência muito mais simples do que os edifícios góticos que se seguiriam. O estilo pode ser identificado em toda a Europa, apesar das características e materiais regionais.
Pintura
Além da arquitetura, a arte do período foi caracterizada por um estilo vigoroso tanto na pintura quanto na escultura. Nas igrejas, a pintura continuou seguindo os modelos iconográficos bizantinos. Cristo em Majestade, o Juízo Final e cenas da Vida de Cristo permaneceram entre as representações mais comuns. Nos manuscritos iluminados, os exemplos mais ricamente decorados do período incluíam bíblias ou saltérios. À medida que novas cenas eram representadas, mais originalidade se desenvolvia. Eles usaram cores primárias intensamente saturadas, que agora existem em seu brilho original apenas em vitrais e manuscritos bem preservados. O vitral veio a ser amplamente utilizado durante este período, embora existam poucos exemplos sobreviventes.
As composições pictóricas geralmente tinham pouca profundidade, pois se limitavam aos espaços estreitos das iniciais historiadas, capitéis das colunas e tímpanos das igrejas. A tensão entre uma moldura apertada e uma composição que por vezes escapa ao seu espaço designado é um tema recorrente na arte românica. As figuras muitas vezes variavam em tamanho em relação à sua importância, e os fundos da paisagem estavam ausentes ou mais próximos de decorações abstratas do que realismo, como nas árvores da “Morgan Leaf”. As formas humanas eram muitas vezes alongadas e contorcidas para se ajustarem à forma fornecida e às vezes pareciam estar flutuando no espaço. Essas figuras focaram em detalhes lineares com ênfase em dobras de cortinas e cabelos.
Escultura
A escultura também exibia um estilo vigoroso, evidente nos capitéis esculpidos das colunas, que muitas vezes representavam cenas completas compostas por várias figuras. Objetos preciosos esculpidos em metal, esmalte e marfim, como relicários, também tiveram alto status nesse período. Enquanto o grande crucifixo de madeira e as estátuas da Madonna entronizada eram inovações alemãs no início do período, as esculturas em alto relevo dos elementos arquitetônicos são mais evocativas desse estilo.
Numa inovação significativa, os tímpanos de importantes portais de igrejas foram esculpidos com esquemas monumentais, novamente representando Cristo em Majestade ou o Juízo Final, mas tratados com mais liberdade do que nas versões pintadas. Essas esculturas de portal foram feitas para intimidar e educar o espectador. Como não havia modelos bizantinos equivalentes, os escultores românicos sentiram-se livres para expandir o tratamento dos tímpanos.
Foi o primeiro estilo a ser identificado dentro da Arte Medieval. Embora inicialmente se referisse ao estilo arquitetônico desenvolvido entre os séculos XI e meados do século XII na Europa Ocidental, o românico foi recentemente alargado a outras áreas da produção artística, incluindo a escultura e a pintura. As principais características da arte românica existem em igrejas ou mosteiros e incluem tetos abobadados e arcos arredondados ou pontiagudos. A decoração escultórica românica surge na forma de capitéis figurativos sobre colunas densas ou em relevos de bronze esculpidos em portas e tímpanos sobre entradas.Sem dúvida estilo que descreve perfeitamente o medievo. Suas origens, sua singularidade, seu simbolismo. Efeitos marcantes na Idade Média, indícios de arte promissora e atraente. Românico, o rústico belo.
Considerado o “melhor cavaleiro do mundo” pelo rei da França, Guilherme Marechal personificou a idade de ouro da cavalaria e fez uma carreira brilhante até se tornar regente do reino da Inglaterra em 1216.
Guilherme nasceu em 1146 em uma família da pequena nobreza da Inglaterra. Seu pai, João, ocupava o cargo de marechal do rei, oficial responsável pela organização dos exércitos do monarca. Em meio à guerra de sucessão desencadeada pela morte do rei Henrique I, em 1135, o pai de Guilherme ficou ao lado de Matilde, a Imperatriz, na disputa que esta travou contra Estevão de Blois pela Coroa da Inglaterra.
Matilde, que saiu vitoriosa do conflito recompensou a lealdade de João oferecendo-lhe a mão de uma jovem de alta linhagem, Sibilla de Salisbury. O casal teve quatro filhos homens e duas meninas. Um deles era Guilherme, que ficaria conhecido como Marechal por causa do título do pai.
Na qualidade de filho mais novo, Guilherme não herdaria terras nem direitos. Em virtude disso, o pai o enviou para a Normandia, para que fosse treinado na arte da cavalaria pelo camareiro do rei da Inglaterra, Guilherme de Tancarville. O jovem Marechal tinha cerca de 20 anos quando foi sagrado cavaleiro.
Guilherme serviria seu tio materno, Patrício de Salisbury. Em sua primeira missaõ importante, participou de uma expedição encarregada de proteger Leonor da Aquitânia, condessa Poitiers e rainha da Inglaterra, enquanta esta fazia uma visita à França pa conter uma rebelião de seus vassalos. No caminho, o comboio foi atacado de surpresa pelo cavaleiro francês Guy de Lusignan e Patrício de Salisbury foi morto. Guilherme tentou defend~e-lo mas foi ferido e preso.
Impressionada com a sua coragem, Leonos da Aquitânia libertou o cativo em troca de reféns. O fato marcou o início de uma carreira brilhante. Guilherme marechal foi escolhido pelo rei Henrique II para cuidar da proteção e da educação do herdeiro do trono inglês, o príncipe Henriqie, o jovem.
Os cavaleiros, no entanto, necessitavam de treinamentos para futuros embates, e os torneios eram a base disso. Como não havia torneios na Inglaterra partiram para a França. Do outro lado do Canla da Mancha, Guilherme venceu quase todos os torneios, o que aumentou sua fama.
Mas no auge, porém, seus antigos e invejosos “parceiros” o acusaram de cometer adultério com Margarida, esposa do príncipe Henrique, o Jovem, que rompeu relações com o Marechal. O cavaleiro de disse caluniado e partiu em peregrinação rumo à atual Alemanha, mas seu senhor se arrependeu e o chamou de volta.
Mas a má sorte parecia perseguir Guilherme, Henrique, o jovem, morreu de repente em 1183. A sucessão ficou incerta, e Guilherme se juntou a Terceira Cruzada. Vitorioso voltou para a Inglaterra em 1187, Henrique II o integrou à corte e lhe concedeu o feudo de Cartmel, na região de Lancashire. Debilitsado e doente, o soberano lhe prometeu também a mão de Isabel de Clare, a “donzela de Striguil”, o que lhe garantiria a posse de 65 feudos. Mas Henrique II morreu antes de lhe conceder a senhoria.
O novo rei, Ricardo Coração de Leão, não gostava de Guilherme desde que este o fizera comer poeira em um torneio. Apesar disso, ao assumir o poder em 1189, honrou a promessa que fizera ao pai; Guilherme Marechal tinha 50 anos quando se casou com Isabel de Clare e se tornou conde Pembroke, entrando para a elite dos grandes senhores feudais.
Súdito fiel de Henrique II e de Henrique, o Jovem, Guilherme cumpriu as suas obrigações feudais com o novo soberano sem muito entusiasmo. Mas manteve relações com Felipe Augusto, rei da França, para poder manter suas propriedades na Normandia.
Manteve a mesma política quando João Sem terra se tornou rei da Inglaterra em 1199. Apesar disso, quando os barões ingleses se rebeleram contra o rei em 1215, Guilherme Marechal apoiou João Sem terra, Por causa disso, á beira da morte, o monarca o nomeou regente do reino em 1216.
Marechal sagrou cavaleiro o pequeno Henrique III, herdeiro do trono, então com 9 anos. Um ano depois, acabou com as pretensões do príncipe Luis da França de herdar a Coroa inglesa ao derrotá-lo na Batalha de Lincoln. Em reconhecimento à sua bravura, o próprio rei da França, Felipe Augusto, qualificou Guilherme como o “melhor cavaleiro do mundo”. Marechal tinha 70 anos na época e morreria dois anos depois.
Após a sua morte, Guilherme Marechal entrou para a história como uma encarnação dos tempos de ouro da cavalaria, como afirmou o medievalista Georges Duby “Na pessoa de Guilherme Marechal sobrevivia o século XIII de suas proezas, aquele que da exuberância tumultousa, aquele de Lancelot, de Gauwain, dos cavaleiros da Távola redonda. Ele poderia avançar tranquilamente em direção à morte, orgulhoso de ter sido o instrumento do derradeiro trinfo da honra contra o dinheiro, da lealdade contra o Estado, de ter levado a cavalaria a sua plenitude”.
Paulo Edmundo Vieira Marques
Historiador, Professor, Escritor Medievalista
Fonte: Guilherme Marechal – O Melhor Cavaleiro do Mundo, Georges Duby, Graal, 1995.
A abadia de Conques foi fundada em 819 d.C., quando a sua área de construção era tomada por uma densa floresta e seu ambiente fornecia isolamento para oração e meditação. O local foi escolhido por um eremita chamado Dadon, que mais tarde fundou uma comunidade de monges beneditinos.
No mesmo ano em que a abadia foi fundada, as relíquias de São Tiago foram descobertas em Compostela, na Espanha. Fluxos de peregrinos logo começaram a chegar ao santuário. As rotas de peregrinação passaram por santuários menores ao longo do caminho, que logo ficaram ricos com presentes de peregrinos e turismo religioso.
Localizada em Conques, Aveyron, França, a Igreja de Sainte-Foy (Santa Fé) é uma importante igreja de peregrinação a caminho de Santiago de Compostela, no norte da Espanha. É também uma abadia, o que significa que a igreja fazia parte de um mosteiro onde os monges viviam, oravam e trabalhavam. Apenas pequenas partes do mosteiro sobreviveram, ainda estão de pé, mas a igreja permanece praticamente intacta. Embora igrejas menores estivessem no local a partir do século VII, a Igreja de Sainte-Foy foi iniciada no século XI e concluída em meados do século XII. Como uma igreja românica, possui uma nave abobadada, com arcos no interior.
É conhecida como igreja de peregrinação, porque muitas das grandes igrejas ao longo do caminho para Santiago de Compostela assumiram uma forma semelhante. Mas cabe ressaltar, também, que se tratava de uma igreja de devoção dos templários. Ponto e local de refúgio dos cavaleiros para adquirir suprimentos para a sua proteção e dos peregrinos que para Compostela se dirigiam. A principal característica dessas igrejas era o plano cruciforme. Esse plano não apenas assumiu a forma simbólica da cruz, mas também ajudou a controlar a multidão de peregrinos. Na maioria dos casos, os peregrinos podiam entrar no portal ocidental e depois circular pela igreja em direção à abside no extremo leste. A abside geralmente continha capelas menores, conhecidas como capelas radiantes, onde os peregrinos podiam visitar os santuários dos santos, especialmente o santuário de Sainte Foy. Eles poderiam circular pelo ambulatório e sair do transepto ou travessia. Esse projeto ajudou a regular o fluxo de tráfego em toda a igreja, embora a intenção e o uso efetivo desse projeto tenham sido debatidos.
Quando um peregrino chegava a Conques, provavelmente se dirigia à igreja para receber bênçãos. No entanto, antes de entrarem, uma mensagem importante os esperava nos portais: o Juízo Final. Esta cena é retratada no tímpano, o relevo semi-circular central esculpido acima do portal central.
No centro, está Cristo como juiz. Ele se senta entronizado com a mão direita apontando para cima para os salvos, enquanto a mão esquerda gesticula para os condenados. Essa cena teria servido como um lembrete para aqueles que entravam na Igreja de Sainte-Foy sobre as alegrias do céu e os tormentos do inferno. Imediatamente à direita de Cristo estão Maria, Pedro e, possivelmente, o fundador do mosteiro, bem como uma comitiva de outros santos.
Abaixo desses santos, uma pequena arcada é coberta por um frontão, destinado a representar a Casa do Paraíso. Estes são os abençoados, aqueles que foram salvos por Cristo e que permanecerão no Paraíso com ele por toda a eternidade. No centro, encontramos Abraão e, acima dele, notamos a mão estendida de Deus, que acena uma Fé Santa ajoelhada (veja a imagem abaixo).
Dentro do inferno, as coisas não parecem muito boas. É uma cena caótica e desordenada – observe como parece diferente do lado direito do tímpano. Há também um pequeno frontão no registro inferior do inferno, onde o diabo, exatamente em frente a Abraão, reina sobre seu reino aterrorizante.
O diabo, como Cristo, também é um juiz entronizado, determinando os castigos que aguardam os condenados de acordo com a gravidade de seus pecados. Em particular, à esquerda do diabo está um homem enforcado. Este homem é uma referência a Judas, que se enforcou depois de trair a Cristo. Logo depois de Judas, um cavaleiro é jogado no fogo do Inferno e, acima dele, um homem guloso é pendurado pelas pernas pelos seus pecados. Cada um desses pecadores representa um tipo de pecado a ser evitado, do adultério à arrogância, até ao uso indevido dos ofícios da igreja. De fato, este portal não era apenas um aviso para os peregrinos, mas também para o clero que vivia em Conques.
A Igreja de Saint Foy em Conques fornece um excelente exemplo de arte e arquitetura românica. Embora o mosteiro não sobreviva mais, a igreja e o tesouro permanecem como um lembrete dos rituais da fé medieval, especialmente para os peregrinos. Ainda hoje, as pessoas fazem uma longa caminhada até Conques para prestar respeito a Saint Foy. Todo mês de outubro é realizada uma grande celebração e procissão para Saint Foy, continuando uma tradição medieval até a devoção atual.
Paulo Edmundo Vieira Marques
Historiador, Professor, Escritor Medievalista.
Este artigo é dedicado ao grande professor e meu querido amigo Francesco De Sio Lazzari (Canuto Decano). Grande mestre da maravilhosa Nápoles.
Durante a idade média, muitos tipos diferentes de capacetes foram fabricados, todos oferecendo níveis de proteção e usados durante batalhas e guerras.
Capacetes medievais eram feitos de ferro e aço, assim como o resto da armadura. Na Idade Média, confeccionados geralmente por um armeiro, que era um ferreiro especializado em fazer armaduras de qualidade. No entanto em certas ocasiões, na falta do armeiro, ferreiros comuns os faziam, sem uma passagem por um mestre orientador, mais baratos, mas com menor qualidade.
Às vezes, símbolos eram pintados ou os brasões eram adicionados aos capacetes para fins de identificação.
No início da Idade Média, os capacetes de rosto aberto, como o spangenhelm, eram os mais comuns. Esses capacetes não protegiam muito bem a área facial. Eles às vezes tinham proteção nasal. No final da Idade Média, o rosto estava completamente protegido com capacetes como o grande elmo, o armet e o bascinet, pelo menos para cavaleiros e homens de classe alta. A cabeça era e ainda é uma das áreas mais importantes do corpo para se proteger, pois as feridas na cabeça e no crânio eram e são muito intensas e de gravidade.
Ao escolher um capacete, você precisava comparar as vantagens e desvantagens, era uma escolha estritamente pessoal. Às vezes era melhor ter um rosto completamente protegido, mas outras vezes era mais útil escolher um capacete mais leve no qual você podia ter mais movimento. Para a infantaria, geralmente a escolha melhor era o capacete mais leve, enquanto um cavaleiro escolhia uma melhor proteção total.
Os homens usavam geralmente uma touca de malha e estofamento embaixo do capacete. Uma touca de malha era um capuz feito de cota de malha, como proteção extra para o pescoço e a cabeça. A touca de malha era costurada em um estofamento de tecido. O estofamento cobria apenas a cabeça, não o pescoço. Poderia ser usado embaixo de um capacete ou mesmo sem o capacete. Isso era comum entre os homens de classe baixa. A maioria dos soldados usava touca justa, onde as únicas partes abertas eram o nariz e os olhos. Uma touca nem sempre tinha correspondência anexada, a palavra ‘touca’ também poderia estar relacionada apenas ao estofamento. Em alguns tipos de capacete, como o bascinet, você poderia prender uma aventail, um colar de cota de malha e um protetor de ombro. Você também poderia usar uma touca acolchoada embaixo do capacete, sem a cota de malha, para maior conforto e proteção contra contusões e escoriações. Também poderia ser usado para ajudar o capacete a se encaixar melhor.
Os spangenhelms e os capacetes nasais ou normandos estavam em uso nas primeiras partes da idade média; mais tarde veio o bascinet sem viseira. Os visores tornaram-se cada vez mais populares após 1180. Os visores tinham orifícios para ver através e orifícios para respirar.
Abaixo, você encontrará vários tipos de capacetes medievais na ordem de sua evolução.
Elmo chaleira
Mais popular no século XI
O capacete da chaleira também era chamado Eisenhut e chapeau de fer, que significava “um chapéu de ferro”. Seu nome veio de sua aparência, como uma panela, chaleira ou caldeirão. Esses capacetes sempre tinham uma aba larga e eram de rosto aberto e às vezes eram usados com uma touca por baixo. Era um capacete comum durante toda a Idade Média e usado principalmente pela infantaria, porque dava boa proteção aos golpes que vinham de cima, como os de cavaleiros, e mantinha o sol fora do rosto dos usuários. Esses capacetes não foram usados apenas durante a guerra, mas também para outras tarefas, como a mineração, onde a borda ajudou a proteger contra a queda de pedras e areia. Antigamente, esses capacetes eram feitos de várias chapas de aço, como os spangenhelms. Por volta do século XIII, eles começaram a fazer o chaleira com uma única peça de aço.
Vantagens
Proteção contra golpes de cima
Sol fora do rosto
Barato
Desvantagens
Sem proteção facial
Spangenhelm
Capacetes usados posteriormente ao século X
O nome deste capacete vem do quadro, que foi feito de tiras. Spangen era a palavra alemã para essas tiras. Essas tiras se conectavam a 4-6 placas de metal. Na maioria das vezes, os spangenhelms tinham uma larga faixa nasal para proteger o nariz, que era o centro da face e era de forma cônica. Você poderia fazer muito com eles em termos de complementação de proteção, como adicionar uma aventail ou uma máscara.
Os primeiros spangenhelms tinham protetores de couro ou metal nas bochechas. Os últimos, os que foram usados na Idade Média, não tinham mais essas guardas. Os soldados também poderiam prender uma aventail no capacete.
Este era um tipo de capacete amplamente utilizado porque era muito fácil de fabricar e, portanto, muito barato de se produzir.
Vantagens
Boa visão e respiração
Fácil de fazer
Barato
Desvantagens
Não muito forte
Sem proteção facial completa
Great Helm
Grandes capacetes, também conhecidos como grande elmo, elmo de panela, heaume ou elmo de balde, são o tipo mais conhecido de capacete. A princípio, esses capacetes tinham um topo quadrado, mas isso se tornou um alvo para os martelos. Mais tarde, os desenhos foram atualizados para um topo cônico (pontudo), diminuindo o impacto de martelos e espadas.
Elmo da Alta Idade Média surgiu no final do século XII, no contexto das cruzadas e permaneceu em uso até o século XIV. Eles foram usados por cavaleiros e infantaria pesada nos exércitos europeus entre 1220 e 1400 aproximadamente. No entanto eles foram utilizados amplamente pelos cavaleiros cristãos na Terceira Cruzada (1189-1192).
Foi um dos primeiros capacetes que protegeu totalmente o rosto. O Grande Elmo também tinha pequenas aberturas para os olhos e perfurações para a boca.
Posteriormente, o capacete foi desenvolvido com proteção em volta do pescoço; eventualmente, todo o capacete estava sobre os ombros do cavaleiro. (Século 14)
Para manter o capacete preso na cabeça, havia uma tira de couro.
Os cavaleiros não usavam essas coisas na cabeça. Por baixo, usavam proteção extra feita de tecido e estofamento de fibra. Isso aqueceu os grandes elmos.
Às vezes, esses capacetes eram pintados de cores, combinando com o escudo do cavaleiro. Às vezes eram adornados com cristas, perfurações para respirar e viseiras decoradas. Quando eles eram decorados com cristas, era usado principalmente para fins cerimoniais ou de identificação. Se você não sabe o que é uma crista, é uma peça de decoração que você pode colocar em cima do seu grande elmo, como chifres, asas ou caveiras.
Esses capacetes eram usados principalmente por cavaleiros durante os tempos das cruzadas, no final da Idade Média.
Vantagens
Proteção facial total
Pouquíssimas e pequenas aberturas: proteção contra perfuração
Desvantagens
Pesado (peso: entre 1,5 kg e 3 kg)
Difícil de ver e respirar
Difícil de comunicar devido às pequenas aberturas
Bascinet e Hounskull
O bascinet, também
chamado berço, era geralmente um capacete de rosto aberto, mas às vezes também
era usado com uma viseira cônica. Isso tinha a aparência de um bico ou um
focinho, por isso foi chamado de hounskull, que é medieval para ‘cara de
cachorro’. Hoje também é às vezes chamado de ‘cara de porco’. Foi
usado por cavaleiros e infantaria, tornando-o um capacete muito popular.
Havia duas maneiras de fixar uma viseira no capacete. O klappvisor tinha
uma dobradiça na parte superior frontal do bascinet. E o pivô lateral com
uma dobradiça em cada lado da cabeça.
Pode-se também prender um aventail ao bascinet com tiras de couro. Uma
aventail é uma cota de malha para cobrir o pescoço e os ombros; saiba que isso
não é o mesmo que uma touca de cota de malha.
No século 14, o bascinet tomou o lugar do grande elmo em popularidade. A
princípio, o bascinet era usado por baixo do grande capacete. Mas os
soldados costumavam tirar o grande capacete para poder se mover um pouco mais
fácil e ter menos peso para carregar.
Os soldados de infantaria tinham que ser muito móveis, ver mais e não deveriam
esquentar, portanto os bascinetes não eram a escolha certa para
eles. Estavam melhor com capacetes mais claros, como o capacete da
chaleira.
Depois de cerca de 1440, esse capacete ficou fora de uso, os nobres e
cavaleiros também começaram a preferir capacetes de rosto aberto (como o
bascinet, mas sem a viseira) por causa do peso dos capacetes visored se tornar
um fardo.
No final do século XV, esses capacetes evoluíram das formas cônicas para formas
mais arredondadas e, assim, passaram para o armet.
Vantagens
Mais leve que o grande leme
Design ajuda a desviar armas
Desvantagens
Vista e respiração
Ainda muito pesado
Armet
A primeira experiência de um capacete que mais se assemelhava à forma da cabeça humana começou na Itália. Este capacete encaixava-se próximo à cabeça e era mais largo no topo e mais estreito no pescoço. Como você não pode deslizar sobre a cabeça, era necessário ter um mecanismo para abrir e fechar o capacete facilmente.
esses capacetes
geralmente consistem em quatro partes. O capacete em si é uma tigela com
uma cauda na parte de trás do pescoço, duas placas na bochecha e a viseira, que
pode ser movida para cima. Normalmente, a parte superior da viseira é a
parte inferior da abertura para os olhos, a tigela do capacete em si é a parte
superior da abertura para os olhos.
Você pode adicionar placas extras como proteção para seu pescoço, isso é
chamado de placa de invólucro. Isso foi útil para a cavalaria (você sabe,
os cavaleiros) não serem atingidos por lanças ou qualquer coisa que venha de
baixo na área do pescoço.
Se você deseja comprar um armet, saiba que esse é um dos capacetes medievais /
renascentistas mais caros, pois possui partes mais separadas e é mais difícil
de fabricar.
Vantagens
Compacto e leve
Proteção completa da cabeça
Desvantagens
Vista
Os elmos foram os protetores faciais dos guerreiros e cavaleiros medievais. Diante de tantas dificuldades nas inúmeras e intensas batalhas e guerras medievais foram sem dúvida, como descreve a simbologia do armamento do cavaleiro uma enorme esperança, sagacidade, inteligência, de pudor, pois diante do sentimento e atitude desenvolvidos por uma cultura rígida calcada em conceitos religiosos, homens corajosos preservavam certas partes do corpo, principalmente a face, para que diante dos ferimentos as cicatrizes fossem amenas e não tão graves. Pois diante de Deus caso o encontrassem em luta poderiam sorrir de forma digna e reconhecível.
Me senti na obrigação de escrever
sobre a maravilhosa cidade cor-de-rosa de Toulouse. Primeira cidade europeia
que eu caminhei e desfrutei dos ares do Norte. Tive muita sorte. Pois Toulouse
é encantadora, espetacular e inesquecível. Perfeita, nem pequena e nem grande.
Tamanho ideal, tem tudo principalmente seu lado cultural, exuberante.
Toulouse, prefeitura de Haute-Garonne e capital da região do Midi-Pyrénées. Midi significa meio-dia aos pés dos montes Pirineus. Midi-Pyrénées não tem unidade histórica ou geográfica. É uma das regiões da França criada no final do século XX para servir como interior e zona de influência de sua capital, Toulouse, uma das poucas “metrópoles de equilíbrio” ( métropoles d’équilibre ).
Aninhada aos pés dos Pirineus, que fica entre ela e a Espanha, a cidade conhecida como ‘la Ville Rose’ (devido aos delicados tons rosa-arroxeados de seus edifícios) tem um passado imensamente rico, que ao longo dos séculos se alternou entre períodos. de prosperidade e tempos sombrios. Vou descrever alguns detalhes históricos medievais sobre Toulouse. Colocações que no meu entender são pertinentes a minha área de estudo.
A história da cidade remonta a mais de 2000 anos, começando pelas Volques Tectosages, uma pequena tribo celta que se estabeleceu no vale do Garonne em 300 a. C. Por causa de sua posição estratégica, Toulouse – que fornecia um elo entre o Mediterrâneo e o Atlântico – já era ( em 100 a.C.) de grande interesse para os romanos, que a tornaram uma de suas colônias no século II d.C.. A colônia prosperou posteriormente com o comércio de vinhos e, no século III d.C, teve sua primeira muralha de proteção, que chegou ao norte até a Porterie (agora Place du Capitole), enquanto seu ponto mais ao sul era Porte Narbonnaise, que agora é Place du Salin e Place du Parlement. Por essa época, o cristianismo foi introduzido na cidade por São Saturnino, que mais tarde morreu nas mãos de uma multidão pagã frenética que o amarrou à cauda de um touro. Muitos dos edifícios e monumentos da cidade citados em sua homenagem lembram seu martírio: Rue du Taur (de ‘taureau’, que significa ‘touro’), igreja Notre-Dame-du-Taur, basílica de Saint-Sernin e estação Matabiau (da matar bios , que significa “matar o touro”).
A partir do século V d.C., a cidade foi sujeita a invasões bárbaras: enquanto os vândalos foram detidos pelas defesas galo-romanas, os visigodos, que vieram da região ao redor do Mar Negro, fizeram da cidade a capital do seu império. Um século depois, os francos, por sua vez, tomaram posse da cidade. Até o século IX d.C., houve um período de calma, quando Toulouse se viu relegada à categoria de simples cidade do condado. Durante a Idade Média, porém, tornou-se (governada por Raimond II) capital do condado de Toulouse. Governada por nobres da cidade, Toulouse se expandiu rapidamente, devido ao grande afluxo de colonos das áreas rurais. A cidade então se estendeu além de seus muros para o norte até a Place Saint-Sernin, e para o sul até a área de Saint-Michel da cidade e para o oeste na margem esquerda do rio Garonne. No século XII, a nobreza perdeu a cidade para os Capitouls ou cônsules da cidade.
No século XII d. C., os cátaros, membros de uma seita herética, tentaram se estabelecer em Toulouse, onde tinham muitos apoiadores. O rei enviou suas tropas, lideradas por Simon de Monfort (morto por uma pedra no local onde hoje está o Grand-Rond), acabou conseguindo derrotar os hereges. Como resultado, a primeira onda da Inquisição varreu Toulouse, trazendo consigo um fervor religioso que estava por trás da fundação da ordem monástica dominicana no Convento dos Jacobinos e, a partir de 1229, da criação de uma universidade teológica. Criada uma cidade real em 1271, Toulouse experimentou um rápido crescimento econômico (graças ao rio Garonne) e floresceu intelectualmente e artisticamente. No entanto, um período sombrio em sua história se seguiria a partir do século 14.
O ano de 1420 foi um ponto de virada na história de Toulouse e marcou o início de um século maravilhoso, cujo tema dominante era a prosperidade. Carlos VII introduziu um órgão judicial na cidade: o Parlamento. Comerciantes de pastel, que enriqueceram exportando esse corante azul derivado de plantas por toda a Europa, convergiram pela Grande Rue (hoje Rue des Filatiers, Rue des Changes e Rue St Rome), construíram magníficas casas de cidade (Hôtel d’Assé, Hôtel de Bernuy) e assumiu o controle de uma rica sociedade de Toulouse, na qual floresceram o design arquitetônico e as belas artes. No entanto, em meados do século XVI, Toulouse experimentou sua segunda grande crise: o índigo, um corante muito menos caro, chegou da América, acabando com o comércio de pastel. Uma nova guerra civil, desta vez entre católicos e calvinistas, causou um enorme incêndio, causando danos incalculáveis e até o século XVII, a fome seguiu rapidamente os numerosos surtos de peste que assolaram a cidade. Seguiu-se um período de desenvolvimento, que levou à concretização de vários projetos industriais, como a construção do pont Neuf, a Place du Capitole e o Canal du Midi.
Até hoje sinto uma enorme saudade de Toulouse. Ali iniciei meus caminhos medievais pela França. Nesta linda cidade me perdi, literalmente, me encontrei e a amei profundamente. Quarta maior cidade da França, lar da segunda maior universidade do país e capital aeronáutica da França, Toulouse é uma cidade dinâmica e voltada para o futuro, cujos tons de rosa (para seus edifícios) e azuis (para seu pastel) são um lembrete constante de seu passado rico e também de agruras. Mas a minha impressão maior de Toulouse foi a de paz, ali gostaria de viver, ali gostaria de permanecer.
Relicário de Limoges, França. 1170. Tesouro do British Museum, Londres.
Na tradição cristã quando um santo falece seus restos ou objetos pessoais são depositados em algum lugar sagrado, geralmente em uma igreja. Estes restos de santos e mártires são guardados em cofres, conhecidos como relicários. Estes cofres são de grande valor simbólico, pois lembram um personagem histórico que se destaca por sua santidade e sua vida exemplar como cristão.
Relíquias ou relicários são os “restos” dos santos; seus despojos, como também os objetos que lhes pertenceram, postos em contato com as suas ossadas ou a sua tumba, e os instrumentos da Paixão. As virtudes das relíquias não dependiam de suas dimensões. Segundo Vitrício De Rouen (final do século IV), a mais ínfima partícula preservada do santo bastava para atestá-lo. Manter em sua posse relíquias de santos renomados era sinal de prestígio e, por isso, motivo de roubos, fictícios ou reais. Na Idade Média, no seu início, começaram a ser levantadas as principais catedrais católicas do mundo, cuja construção era financiada por donativos da comunidade. Nesse contexto, a capacidades dos templos de atrair fiéis e peregrinos dispostos a ceder generosas contribuições estava diretamente relacionada à quantidade de relíquias expostas para veneração.
Foram muitos os casos de relíquias que percorreram grandes distâncias, dos locais onde os santos haviam morrido até as suas novas comunidades adotivas, o que era tratado como expressão da vontade do próprio santo. Já no século I, o corpo de São Tiago aportou milagrosamente nas costas da Galícia em um barco sem leme, e, depois disso, orientou dois touros indomáveis até levá-los em uma carreta ao local onde foi construída uma igreja em sua homenagem, em Compostela. O corpo de São Marcos foi levado, por mercadores, de Alexandria para Veneza em 468, e, como prova de que estava indo de bom grado para a sua nova moradia, danificou o navio onde viajava um incrédulo que duvidara ser aquele o corpo do santo. Evidentemente, se o santo não desejasse ser transportado, jamais teria permitido aos homens movê-lo de seu sepulcro original. O corpo de Santo Agostinho teve de deixar a Sardenha, que estava despovoada pelos sarracenos, rumo a Pávia. Encontrando-se em Gênova, Santo Agostinho recusou-se a partir até que obteve do rei a promessa de que, caso o santo se deixasse levar construiria naquele lugar uma igreja em seu nome. O mesmo aconteceria na cidade vizinha de Casal. Como o rei viu que esse procedimento agradava ao santo, ordenou que em todos os locais onde o santo pernoitasse se construísse uma igreja da mesma invocação.
Sapato Relicário, 1350-1400, França ou Suiça.
Cenas da lenda de Santa Margarida de Antioquia são usadas neste caso para um relicário na forma de um pé. De acordo com sua lenda, Santa Margarida foi engolida por um dragão, mas, fortuitamente, ela estava carregando uma cruz que fez a barriga do dragão se abrir e o santo ser libertado. Santa Margarida foi uma das catorze Santa Auxiliadoras e padroeira do parto, invocada por mulheres para proteção durante o parto.
Havia gente especializada no tráfico de relíquias. Foi o caso do diácono Deusdona, pilhador das catacumbas. A translação de relíquias exigia, porém, o acordo do príncipe ou de uma assembleia de bispos. A cerimônia era celebrada com fausto, e as relíquias eram veneradas ao longo de todo o trajeto. O depósito de relíquias nos altares, a translação dos santos às igrejas e sua instalação sob o altar trouxeram importantes transformações arquiteturais (elevação do coro, construção de uma cripta) e sociais (pela inumação ad Sanctos, os mortos adquiriam seus direitos entre os vivos).
Crucificação e Cristo em Majestade. 1180-1190, Limoges, França.
A tomada de Constantinopla em 1204 renovou o estoque de relíquias no Ocidente. “Santas Capelas” como a de Paris, vide o meu artigo sobre Saint Chapelle neste mesmo site, abrigando a Coroa de Espinhos (cuja consagração data de 1248), foram erigidas. De início, o relicário constituía-se de um simples cofre, deram-lhe também a forma do membro conservado e, às vezes, da estátua toda do santo.
Mais tardiamente, pequenas janelas abertas nos relicários permitiam aos fiéis entrever os despojos santificados, expostos por ocasião das grandes cerimônias.
O IV Concílio de Latrão, em 1215, decidiu que a veneração de novas relíquias dependeria do acordo prévio do papa. A medida não impediu os muitos abusos, denunciados por Calvino em um panfleto.
Relicário de St. Taurin, Evreux, França, século XIII
As curas, as emanações maravilhosas e suntuosas, os traslados milagrosos e misteriosos a incorruptibilidade eram as provas de que os santos estavam privando da companhia de Cristo, de que suas relíquias eram materiais, artefatos divinos que rompiam as barreiras do tempo e do espaço. Justamente por serem investidas de enormes poderes e carisma, as relíquias sagradas estiveram no centro das disputas religiosas na Europa medieval e no início da Idade Moderna.
Relicário de Liga de Cobre, encontrado na França, de 1250. British Museum.
Uma das estátuas mais intrigantes do período medieval mostra-nos uma dama esculpida por um mestre desconhecido. Postura emblemática nos atrai de sobremaneira. Marcantes traços nos levam a pensar e refletir quem era esta mulher. Inicialmente a instigante madame Uta, conta quase 800 anos de idade.
Uta de Ballenstedt nasceu em meados do ano 1000 e morreu em 23 de outubro de 1046, foi marquesa de Meissen de 1032 ou 1038 a 1046 como a esposa de Ekkehard II de Meissen. É conhecida por estar representada na estátua feita pelo Mestre de Naumburg.
Era filha do Conde Adalberto I de Ballenstedt e de Hida, filha de Odo I da Marca Oriental Saxã. Ela era a irmã de Esico de Ballenstedt, fundador da Casa de Ascânia. Recebeu uma excelente educação literária a partir dos seis ou sete anos pelas freiras da Abadia de Gernrode, fundada pelo seu tio-avô, o conde Gero. A tia-avó da bela Uta de Ballenstedt, irmã de Gero, foi responsável pela educação da princesa quando criança.
Por vontade do pai, Uta se casou em 1026 com Ekkehard II de Meissen para fortalecer sua influência ao leste de seu território. Meissen havia sido fundado em 965 por Otão I, Imperador do Sacro Império Romano-Germânico. A marquesa foi famosa pela sua força e coragem, tendo construído a Catedral de Naumburg. Contudo, não teve filhos e após a morte de seu marido a dinastia de Ekkehardienne chegou ao fim.
Depois da viuvez, a residência da senhora Uta variava entre a Abadia de Gernrode, onde sua irmã Hazecha era a abadessa, e a corte da Imperatriz Inês da Aquitânia, onde morreu em 1046.
Uta de Ballenstedt e seu marido Ekkehard II
Há mais de 700 anos Uta, de Ballenstedt, observa de cima os visitantes da Catedral de Naumburg: muda, misteriosa, com a gola do manto levantada, orgulhosa, inatingível e, no entanto, vulnerável. Ao lado dela, no grupo formado por um total de 12 familiares, está o esposo, Ekkehard II. Ao lado do irmão, ele é considerado o patrono desse edifício litúrgico entre os estilos românico tardio e gótico, preservado até hoje.
O “Mestre de Naumburg” não esculpiu santos na pedra, mas sim nobres, aos quais deu um gestual e almas próprias. Com essas figuras de arenito em tamanho natural, ele concluiu sua principal obra em 1249, após dez anos de trabalho.
Os historiadores também estão seguros de que o escultor e arquiteto viveu 200 anos depois dos patronos que retratou. Mas é como se os tivesse conhecido de perto: jamais antes um artesão-artista produzira figuras tão expressivas e exatas nos detalhes.
A biografia do próprio escultor, por outro lado, permanece envolta em mistério: nem mesmo seu nome chegou até nosso tempo. Porém tudo indica que essa obra de arte total – que é a catedral da cidade na Saxônia-Anhalt – não se deva a um único artista solitário. Mais provável é que um grupo de artesãos tenha primeiro sido formado e instruído no norte da França, sob a supervisão de um “mestre”, para mais tarde atuar em outras partes da Europa.
Seu estilo de retratar indivíduos em três dimensões – sensacional na época – também se encontra nas catedrais francesas de Reims, Amiens, Noyon, Chartres e Metz. Em seguida, o Mestre de Naumburg deve ter se mudado para Mainz. Supõe-se que também as célebres estátuas da Catedral de Meissen sejam obra sua. É nessa cidade da Saxônia que seus rastros se perdem definitivamente em 1250.
Catedral de Naumburg, Alemanha
O mestre também deixou sua marca artística no portão que dá acesso ao coro leste da Catedral de Naumburg. Trata-se de uma imagem de Jesus pregado à cruz, no rosto uma dor imensa, ao seu lado Maria verte lágrimas amargas. O crucifixo não se encontra em local inatingível para o visitante, mas sim quase à altura dos olhos. Segundo os especialistas em história eclesiástica, assim está caracterizada a presença terrena do Filho de Deus tornado homem, em toda sua dor e sofrimento.
A beleza da estátua de Uta de Ballensdetd nos remete a essência do trabalho do Mestre de Naumburg mas além disto nos faz refletir o olhar, a postura, a imposição desta dama que é um ícone do medievo.
Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista.
Claustro, recinto quadrilátero cercado por passarelas cobertas e, geralmente ligado a uma igreja monástica ou catedral e às vezes a uma faculdade. O termo usado em um sentido restrito se aplica às passarelas e a seus vários caminhos do seu interior. A área central, amplo sentido, abrange em geral as casas das ordens religiosas, jardins, capelas e, em um sentido genérico para lugares de retiro para fins religiosos e discussões estruturais e administrativas, como as Salas Capitulares*.
Sua estrutura, sua edificação arquitetônica era feita no sentido de proporcionar o mais restrito e completo retiro espiritual aos seus moradores. O “santo silêncio” não deveria ser perturbado pelos ruídos do mundo lá fora. Os claustros medievais educavam, formavam novos soldados da fé católica, monges, cônegos, abades, etc., através da clausura, mas de intensa dedicação e trabalho na manutenção espiritual e material do local onde viviam.
Claustro da Abadia Canterbury, Inglaterra.
Um claustro é geralmente a área em um mosteiro em torno do qual os edifícios principais são variados, proporcionando um meio de comunicação entre os edifícios. Na prática medieval desenvolvida, os claustros costumavam seguir um arranjo beneditino ou cisterciense. Na forma beneditina, a igreja estava localizada de um lado do claustro, com o refeitório ocupando o lado oposto, para que os adoradores pudessem ser removidos dos ruídos e odores da cozinha. A casa do capítulo foi colocada no lado leste, com outros apartamentos adjacentes a ele e o dormitório geralmente ocupando toda o seu entorno. No lado ocidental, encontrava-se a adega, perto de armazéns que possuíam as provisões da comunidade.
Nos monastérios cistercienses, o lado ocidental do claustro era habitualmente ocupado pelo domus conversorum* de dois andares, com as salas do dia e as oficinas situadas sob o dormitório. Os edifícios geralmente ficavam no sul da igreja para obter o máximo de luz do sol possível.
Claustro de Saint-Trophîme, Arles, França.
O claustro de uma casa religiosa era o centro de atividade para seus habitantes. Em suas salas adjacentes os membros mais jovens eram educados e os anciãos estudavam e eram tratados caso adoecessem. A caminhada oeste era tradicionalmente, se não oficialmente, o lugar da instrução educacional. As outras passarelas, especialmente as que ficavam ao lado da igreja, foram dedicadas aos estudos dos monges mais velhos e, neles se incluía canções de Natal, cantos em Geral, aprendizado para tocar órgãos e outros instrumentos essenciais para o coro das igrejas. O claustro também serviu para exercícios físicos e recreação geral, particularmente em mau tempo e, sua área central e passarelas eram os lugares habituais de encontros dos monges para conversas, meditações, etc.
Claustro da Abadia de Fontfroide, Narbonne, França.
Sala Capitular, corredor central do claustro da Abadia de Fontfroide, Narbonne, França.
Maiores estabelecimentos monásticos costumavam ter mais de um claustro; geralmente havia um segundo contato com a enfermaria (por exemplo, na Abadia Westminster e Canterbury) e às vezes um dando acesso à cozinha e outros escritórios domésticos. Os claustros também estavam ligados às faculdades de caminhos seculares, como nas catedrais de Lincoln, Salisbury e Wells; e as faculdades de Eton e Winchester, bem como New College e Magdalen College em Oxford, também têm claustros.
Os primeiros claustros consistiam em arcadas abertas, geralmente com telhados de madeira inclinados. Esta forma de claustro foi geralmente substituída na Inglaterra por uma variedade de janelas, geralmente não esmaltadas, mas às vezes, como em Gloucester, provido de vidro, iluminando um ambulatório abobadado. Nos climas do Sul, o claustro de arcada aberta permaneceu padrão; deste tipo são os claustros de Saint-Trophîme em Arles, no sul da França, Santo Domingo de Silos em Espanha e o Mosteiro de Belém, perto de Lisboa, todos os quais são famosos pela sua decoração escultural. No entanto, o claustro aberto alcançou o seu maior desenvolvimento na Itália.
Claustro de Iranzu, Abarzuza, Navarre, Espanha
Ahhh! Claustros silenciosos, moradas dos anjos, recintos de estudos. Quantas aptidões, ensinamentos repassou. Quantos choros ouvistes. Tristezas, muitas, mas opcionais. Risos, escassos, mas sinceros. Enfim que mundo maravilhoso onde foram construídos ideias e pensamentos de todos os modos e sentidos. Os que lá se recolheram de alguma forma ou de outra em algum momento, através do infinito silêncio, pois ele é uma confissão interior conversaram com os anjos e, isto com certeza deve ter ocorrido. Ahhh! Os claustros, enigma que só o vento decifra.
Eu junto ao claustro da Abadia de Fontfroide, Narbonne, França
*Sala Capitular. A Sala do Capítulo é um salão encontrado em mosteiros, conventos, colegiadas ou catedrais onde era realizado o capítulo, ou seja, as reuniões entre os monges ou cónegos com os seus superiores, como abades, priores. Nestas assembleias podiam ser discutidas tanto as regras da ordem como questões relacionadas com a administração do mosteiro. Nos mosteiros, as salas do capítulo eram feitas de materiais nobres e robustos e ornamentados com esmero e encontravam-se junto aos claustros.
*Domus Conversorum” às vezes era usado também para descrever o lar dos irmãos leigos nos mosteiros.
Paulo Edmundo Vieira Marques, Professor, Historiador e Escritor Medievalista
Construída sobre uma pedra de granito rosa, ao lado do rio Armançon, Semur-en-Auxois é uma cidade medieval por excelência. De acordo com a lenda, foi construída por Hércules em seu retorno da Espanha, no caminho para completar os doze trabalhos que lhe foi incumbido para se tornar um Deus. Para manter esta ideia “grega” de cidade, foi considerada e estimulada a ser chamada pela elite intelectual que nela residia de “a pequena Atenas da Borgonha” no decorrer do século XVIII. Basta atravessar as suas portas para nos transportarmos até o século XV.
É em 606, na carta de fundação da Abadia de Flavigny-sur-Ozerain, que se encontra o primeiro traço escrito sobre Semur, equivalente a muro, muralhas (paredes antigas) enfatizando assim o caráter defensivo do local. Na Alta Idade Média, o núcleo de habitantes primitivos é agrupado em torno dos muros construídos diante do enorme granito. No século XI, Semur tornou-se a cidade-chefe do município de Auxois, sendo integrada ao ducado da Borgonha. Ao longo dos séculos, Semur desenvolveu-se e, em 1276, tornou-se comuna e se beneficiou com as concessões e benefícios dados pelo duque da Borgonha Robert II. O monarca gostava muito da pequena fortaleza medieval e admirava e até acreditava que o vilarejo fora criado por Hércules.
A cidade assumiu toda a sua importância em meados do século XIV, na época da Guerra dos Cem Anos, quando o Duque Philip, “o ousado”, decide reforçar as defesas naturais do local construindo torres de vigília e proteção, um forte, em um lugar chamado Donjon situado entre o distrito do castelo e o bairro que se desenvolveu em torno do Igreja de Notre Dame.
A vida religiosa também era intensa, com duas paróquias e assentamentos monásticos que cresciam constantemente ao longo do tempo.
Semur-en-Auxois no vale do Armançon uma cidade extremamente fortificada no Auxois, era fiel aos Duques da Borgonha, a ponto de se opor à autoridade real. Uma posição que pagou um preço elevado quando, em 1478, as tropas francesas de Louis XI investiram contra a cidade e a ocuparam.
A cidade perdeu sua vocação defensiva para se tornar a capital administrativa de Auxois, em 1790, tornando-se cidade-chefe do distrito de Semur. Permanece até 1926, quando a sub-prefeitura é transferida para Montbard.
Em termos turísticos é um dos destinos mais concorridos da região atravessada pelo rio Armançon. Suas ruas rústicas com calçamentos medievais nos transportam a vários pontos inesquecíveis. O medievo pulsa.
Seguindo rumo a zona mais alta da cidade chegaremos à chamada Porta do Relógio, que nos leva a uma praça repleta de monumentos históricos que nos deixam boquiabertos tamanha beleza. As Quatro Torres é outro local para se visitar e se encantar pois as estruturas originais do Castelo de Semur ainda permanecem intactas em especial a torre de estilo renascentista em forma de tabuleiro de xadrez.
Cruzando a Ponte Joly que atravessa o rio Armançon podemos divisar as torres e obter excelentes fotografias panorâmicas da cidade, um lugar realmente de conto de fadas. Para um historiador, um museu a céu aberto.
Conhecer a Igreja de Notre Dame levantada no século XIII é uma recompensa para quem ama a arte gótica, por sinal toda a praça principal de Semur nos leva ao auge do gótico. Também vale a pena visitar o Convento dos Jacobinos, construído no século XVII que guarda em seu interior o Museu de História de Semur. Enfim atrativos não faltam para esta linda cidade medieval, criada, segunda a lenda, por Hércules. Os amantes do medievo agradecem a presença do herói grego em seu contexto. Até um dia linda cidade.
Igreja de Notre Dame de Semur-en-Auxois, maravilha gótica.
Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista
Villefranche-de-Rouergue é a primeira “cidade nova” fundada por Alphonse de Poitiers em 1252. Esta inovação estrutural das cidades marcou a floração e progresso da região de Midi-Pyrénées durante a Idade Média.
A bastide alfonsina é criada no coração de um vale, num território com abundantes recursos naturais (pedreiras, veias de prata, terras aráveis), e terras agrícolas complementares. Sua vocação é reagrupar uma população dispersa para organizar e criar trocas econômicas favoráveis ao seu fundador e seus habitantes. A bastide de Villefranche-de-Rouergue adota um plano urbano regular, composto por uma série de ilhotas de casas em faixas, que reúnem uma rede octogonal e ruas longitudinais (principais) e transversais (secundárias). Quatro das oito principais ruas se conectam à Praça Notre-Dame, centro de instituições comerciais, políticas e religiosas. Este grande quadrado alinhado com estantes e feiras é aonde o mercado ocorre, e é dominado pela Catedral de Notre-Dame.
As ruas de Villefranche me transportou para a Idade Média, literalmente. Ruelas estreitas de uma peculiaridade marcante. Portas antigas e lindas, janelas decoradas, lojas convidativas, pessoas felizes, enfim, minha mente guarda com carinho os passos que percorri do ônibus até a praça central. Inesquecíveis.
Se você quiser ter um bom exemplo do que é uma bastide*, você encontra em Villefranche de Rouergue, uma vila de origem medieval que foi criada em 1252, e agora tem cerca de 8.500 habitantes, no departamento de Aveyron, no Midi-Pyrénées.
Localizado nas margens do rio que dá seu nome ao departamento, a bastide de Villefranche de Rouergue é organizada em torno da praça de Notre Dame, o ponto central desta cidade, onde se encontra a abadia de Notre Dame, um edifício que começou a ser construído 1260 e foi concluído no final do século XV.
Esta praça é também o local para o tradicional mercado das quintas-feiras, que estabelece em Villefranche, neste dia da semana, uma ótima atmosfera de visitantes atraídos por bancas de rua.
A melhor maneira de ver a bastide de Villefranche de Rouergue é escalar o campanário da abadia com sua escadaria circular estreita de 163 degraus.
Do ponto de vista da torre você tem uma vista esplêndida da bastide, com a praça Notre Dame em primeiro plano. Se você visitar a cidade numa manhã de quinta-feira, a partir daí você pode ver as telas coloridas que cobrem as bancas do mercado, criando uma imagem muito peculiar.
Na minha visita em abril de 2015, não pude ver a feira pois a excursão não visitou a cidade em uma quinta-feira. Mas andando pela praça tive a oportunidade de admirar sua bela configuração medieval e desfrutar das mais variadas perspectivas arquitetônicas da linda cidade. Todo o lugar desperta-nos uma sensação convidativa, um “não quero mais sair daqui”. A cidade nos intriga positivamente. Também a partir da torre da igreja você pode ver algumas edificações que se destacam na cidade, bem como a aglomeração de edifícios e os becos estreitos que mostram como foi configurada a vila medieval a partir do século XIII. Apesar de contratempos a cidade me cativou. Um dia ainda espero retornar a bastide, de preferência em um dia de feira. Ahh! Doce Villefranche, sinto saudades.
*É um tipo de cidade medieval fortificada que foi desenvolvida especialmente no sul da França a partir do século XIII, que com seu layout urbano especial proporcionou segurança aos seus habitantes e permitiu o desenvolvimento de atividades comerciais.
As bastides eram aldeias fortificadas com casas muito agrupadas pela estreiteza de suas ruas, que estavam dispostas em torno de uma praça central, e que se transformaram em lugares realmente fortes que permitiram defender-se dos ataques dos bandidos.
Atualmente, na França estão catalogados 415 bastides. Todas no sudoeste do país, distribuídas em quatro departamentos.
Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista.
Este texto é uma homenagem a minha grande e querida amiga Maria Cristina Aguado Casal. Mulher de extrema sensibilidade e generosidade. Abraço e obrigado por ser minha amiga
Estaing, a princesa do Lot, a guardiã do lindo rio foi uma grata surpresa. Maravilhoso vilarejo medieval do Departamento de Aveyron com cerca de 800 moradores permanentes. Meu encantamento fez meu coração acelerar desde o primeiro momento que a vi. Você já pode ver sua silhueta no final do vale quando se aproxima da estrada, com seu castelo medieval que se eleva sobre os telhados pretos de ardósia das casas em um pequeno aclive e com a ponte gótica que dá acesso e permite atravessar o rio Lot.
Estacionamos o ônibus em uma ruela a beira do rio e começamos a visitar suas principais atrações e, como não poderia deixar de ser o nosso objetivo maior era o imponente castelo da linda cidadezinha medieval.
Começamos a atravessar a aldeia através do “Quartier du Barry”, o bairro que estava fora dos antigos muros medievais e vislumbramos belos edifícios de séculos diferentes (que vão do XVI ao XVIII), como por exemplo a velha escola de St. Fleuret, a casa burguesa construída em 1774 que hoje abriga a Hospedaria de Saint Jacques ou a mansão de Cayron que atualmente abriga a prefeitura. A minha alegria era tanta que corria por suas ruelas com um enorme sorriso em meu rosto que os meus amigos se admiravam com tamanha felicidade. Felizes chegamos à Place François Annat, onde estão os principais pontos de interesse da cidade: o castelo e a igreja.
O castelo foi construído pela família Estaing (uma família nobre da região de Rouergue) no século XIII em torno de uma torre pentagonal existente. Esta tornou-se sua residência familiar e particular por quase oito séculos. Mais tarde, passou para as mãos da congregação religiosa St. Joseph d’Estaing (especificamente de 1836 a 2000) que impediu que caísse em ruínas. Foi classificado como um monumento histórico em 1945 e, desde 2012, pertence à Fundação Valéry Giscard d’Estaing (de propriedade do ex-presidente da República Francesa).
Posteriormente descemos em direção a sua magnífica ponte, onde a princesa Estaing guarnece a travessia do rio Lot, antigamente importante caminho de trocas comerciais.
A ponte gótica de Estaing, com seus 4 arcos pontiagudos que corta as margens do rio Lot é classificada como Patrimônio Mundial da UNESCO como parte do Caminho de Santiago de Compostela. Começou a ser construído em torno do ano 1490 e foi finalmente concluída sob a direção de François d’Estaing, e é por isso que em 1886 uma estátua dele foi instalada lá em frente à aldeia. Também na ponte podíamos ver a famosa Cruz de Ferro Forjado, símbolo da região do Aveyron e que inspirou o ourives Henri Lesieur a projetar um pendente hoje famoso.
No final da ponte, podemos ver um antigo Oratório do ano de 1524, consagrado a Nossa Senhora das Sete Dores.
Nossa visita, em abril de 2015, em plena primavera de Aveyron, foi de uma sensação indescritível. Estaing nos forneceu e nos remeteu a vários sorrisos.
Conversando com um morador, ele me disse que é muito bonito e instigante visitar Estaing, no segundo final de semana de setembro, pois você encontrará suas festas medievais e você poderá ver as pessoas vestidas com a indumentária do período, com caracterizações perfeitas, um mercado que vende produtos artesanais, torneios de cavaleiros, trovadores e um ótimo banquete sábado à noite.
Espero um dia revê-la princesa e que seja de preferência na segunda quinzena do mês de setembro. Até lá milady.
Paulo Edmundo Vieira Marques
Professor, Historiador e Escritor Medievalista
As catapultas medievais são mecanismos de cerco que utilizam uma espécie de braço para lançar um objeto (pedras e outros) a uma grande distância, evitando assim possíveis obstáculos como muralhas e fossos.
Em termos técnicos, as armas de cerco aproveitavam os princípios de funcionamento de duas armas muito antigas, mas também muito eficientes: o arco e a funda, espécie de corda para atirar pedras. Em diferentes momentos históricos, foi o aprimoramento e a junção das duas invenções que permitiu o surgimento da artilharia. A partir delas dá para estabelecer duas linhas evolutivas para contar essa história. A primeira, que aconteceu no Ocidente, foi a que originou a catapulta propriamente dita. Com significado em grego indicando algo como “jogar contra”, a catapulta foi uma das poucas armas da Antiguidade com local e data de nascimento registrados: a cidade-Estado grega de Siracusa, na ilha da Sicília (atual Itália), por volta de 399 a.C. Mas há um mistério. O artesão que bolou a catapulta permanece desconhecido. Uma das explicações é que, provavelmente, o engenheiro que concebeu a peça era um escravo. E escravos não podiam levar a fama.
O invento, com uma tecnologia mais avançada, que ficaria conhecido no Ocidente com o nome de trebuchet, foi construído por forças cristãs que combatiam na Terra Santa durante a Terceira Cruzada (1189-1192). O comandante da expedição, o rei inglês Ricardo Coração de Leão, tinha uma adoração especial por dois enormes trebuchets apelidados por ele de Catapulta de Deus e Vizinho Mau, que abriram enormes brechas na fortaleza da cidade de Acre.
Originalmente, a palavra catapulta referia-se a um lançador de pedras, enquanto balista basicamente, uma grande besta que atirava diversas flechas e dardos, seguindo uma trajetória horizontal, semelhante a passar um prato rapidamente, de um lado para o outro, sobre uma superfície plana.
As manganelas eram catapultas enormes e com rodas, capazes de atirar pedras e outros projéteis, à grandes distâncias, normalmente contra as muralhas dos castelos. Os itens eram colocados em uma tigela ou balde e atirados com um braço, também conhecido como onagro.
A poderosa Trabuco era usada atirar muitas pedras, ou objetos em chamas, de uma só vez. Era considerada a catapulta mais perigosa de todas. Porém, através dos anos, os termos foram gradativamente sendo modificados.
Para preparar a catapulta, os soldados apertavam a corda, girando o sarilho. Com isso, as cordas na base do braço eram torcidas, ficando cada vez mais apertadas. Os soldados então colocavam no receptáculo uma pedra muito grande ou outros objetos, e depois soltavam a corda. As cordas em volta da base se desenrolavam todas ao mesmo tempo e o braço se movia para frente, lançando sua carga. Uma catapulta grande era capaz de arremessar uma pedra por até 460 metros de distância.
As catapultas em geral eram usadas para destruir muros de castelos. Para atacar um castelo, normalmente era necessária mais de uma. As catapultas também eram usadas para arremessar lanças contra um exército inimigo quando este avançava.
Os exércitos usavam catapultas grandes e pequenas. As menores eram montadas sobre rodas e levadas para as batalhas. Carpinteiros que viajavam com os exércitos construíam catapultas ao longo do percurso até as batalhas. As de grande porte geralmente ficavam em um só lugar e eram usadas pelos moradores das cidades e dos castelos para se defender.
Sem sombra de dúvida um vizinho indigesto, incômodo e letal durante uma batalha medieval. Arma que escreveu uma história militar medieval de extrema relevância e importância pois originou perspectivas sociais e políticas em vários reinos do medievo.
Paulo Edmundo Vieira Marques – Professor, Historiador e Escritor Medievalista.